O hotel de luxo que virou prisão de guerra e morada de sem-teto
O Grande Hotel da Beira, erguido na costa do Índico há 63 anos, já foi símbolo de opulência em Moçambique
Elefante branco
Inaugurado em 1955 na cidade de Beira, mil quilômetros ao sul de Maputo, a capital de Moçambique, o Grande Hotel era um dos mais sofisticados da África. Com traços curvilíneos às margens do Índico, tinha piscina olímpica, grandes escadarias, restaurantes, cinema e 122 quartos, além de um cassino, que nunca chegou a funcionar (Moçambique ainda era uma colônia de Portugal, que proibia o jogo). Apesar (ou por causa) da pompa, o hotel não atraía muita gente e o negócio logo se mostrou pouco rentável.
Não há vagas
Em 1963, o hotel passou a ser usado apenas para grandes eventos. A última festa particular foi o Réveillon de 1981. Durante a Guerra Civil Moçambicana (1977-1992), ele serviu de base militar e cadeia para presos políticos. Após o conflito, o Grande Hotel foi abandonado, mas, com o tempo, pessoas sem moradia o ocuparam. Hoje, ele conseguiu o que não alcançou nos primeiros anos: está lotado, com 3,5 mil moradores.
Feira indoor
Não há água encanada, luz elétrica nem saneamento básico. As enormes rachaduras nas paredes deixam claro que há risco de acidentes. Nos arredores do prédio (e até nos corredores), barraquinhas vendem produtos como açúcar, ovos, biscoitos, legumes e frutas. A antiga piscina olímpica hoje serve como uma grande lavanderia. A pobreza não é muito diferente de boa parte do país, que tem o 5º pior IDH do mundo.
Terra com lei
Os moradores do hotel não pagam aluguel, mas, como em outras ocupações, há regras. Na falta de um serviço de coleta de lixo, é proibido jogar resíduos nas áreas comuns. Quem brigar ou causar qualquer tipo de tumulto leva uma advertência, e pode acabar banido se repetir a infração. Aqueles que agredirem mulheres ou crianças podem ser expulsos imediatamente.
Gerações
Algumas famílias vivem no hotel há três gerações. Casais, idosos e crianças subdividem quartos com colchões. Mas as pessoas não ocupam apenas os leitos. Tem gente vivendo nos bares e até sob as escadas, que podem abrigar famílias inteiras. Hoje, 26 anos depois do fim da guerra, mais da metade da população do Moçambique vive com menos de US$ 60 por mês – abaixo da linha da pobreza, segundo o Banco Mundial.