Como a canção “My Way” desencadeou uma série de assassinatos em karaokês filipinos
Na década de 2000, as Filipinas registraram pelo menos seis mortes após conflitos causados pela música de Frank Sinatra. Entenda.
No Brasil, happy hour é sinônimo de barzinho regado a cerveja e porções de frituras. Nas Filipinas, é sinônimo de karaokê: as salas com microfones fazem parte do fim do expediente e das madrugadas do arquipélago. Os encontros entre amigos e família também quase sempre envolvem cantoria. Os filipinos levam o hobby a sério – talvez até demais.
Segundo o jornal The New York Times, a imprensa local reportou pelo menos seis assassinatos em karaokês filipinos na década de 2000. Como se o fenômeno já não fosse bizarro por si só, os casos têm mais em comum: foram causados enquanto alguém cantava a música My Way, de Frank Sinatra.
Ninguém sabe ao certo quantos mortes a música causou. A versão local de revista americana Esquire, por exemplo, aponta 12 assassinatos entre 2002 e 2012. Ela também reportou uma morte mais recente, de 2018, relacionada à canção.
Esses episódios ficaram conhecidos como os assassinatos de My Way (My Way killings). Para evitar ataques, alguns estabelecimentos chegaram a retirá-la do catálogo, mesmo sendo uma das canções mais populares dos karaokês.
Um dos casos mais famosos ocorreu na cidade de San Mateo, em 2007. Romy Baligula, de 29 anos, foi interrompido pelo segurança do karaokê enquanto cantava a famigerada música. O segurança disse que ele estava cantando fora do tom, e estragando a canção. O cliente não largou o microfone, e foi baleado no peito após o segurança sacar uma pistola calibre .38. Baligula morreu no local.
O caso de 2018 ocorreu com um homem chamado Jose Bosmion, em Dipolog City. Ele comemorava seu aniversário de 61 anos, em um karaokê, quando seu vizinho subiu no palco para cantar a música de Sinatra. Bosmion disputou o microfone e os dois começaram uma briga. Embora os convidados tenham tentado separá-los, o vizinho usou uma faca para golpear Bosmion, que morreu antes de chegar ao hospital.
Possíveis explicações
Além da aparente intolerância com cantores ruins, o que pode estar por trás dos assassinatos de My Way nas Filipinas? O professor Roland B. Tolentino, da Universidade das Filipinas, tentou explicar o fenômeno ao The New York Times, em 2010. “As Filipinas têm uma sociedade muito violenta, então o karaokê só desencadeia o que já existe lá quando certas regras sociais são quebradas”.
Além disso, ele concorda que a música de Frank Sinatra, em específico, tem um aspecto “triunfal” que pode contribuir para a violência. Segundo Butch Albarracin, dono de uma escola de música em Manila, “a letra desperta sentimentos de orgulho e arrogância no cantor, como se você fosse alguém, quando na verdade você é ninguém. Ela cobre seus defeitos. Por isso que leva a brigas”.
Já Mary Talusan Lacanlale, pesquisadora em etnomusicologia, acredita que essa seja uma visão simplista. Em entrevista ao cineasta Aria Inthavong, Lacanlale diz que há uma espetacularização da população filipina e sensacionalismo, principalmente dos jornais americanos, em torno dos assassinatos de My Way. “Eu não acredito que isso teria se tornado manchete se tivesse ocorrido com uma canção filipina, por exemplo”.
A explicação também pode ser mais simples. My Way é uma das canções mais tocadas em karaokês – logo, é mais provável que ocorra um episódio de violência enquanto ela está na tela. Some isso ao fato de se tratar de uma música épica – e, honestamente, precisar de certa afinação para ser cantada.
Seja qual for a explicação, melhor evitar Frank Sinatra se estiver em um karaokê filipino.