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Dependência química: Fuga do beco sem saída

Entre a polícia e as clínicas de recuperação, pouquíssimos dependentes conseguem largar as drogas. Além das ilegais, como o grande problema no Brasil são as drogas fáceis de obter. Como álcool, cola de sapateiro e tranqüilizantes.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h36 - Publicado em 31 mar 1992, 22h00

Lúcia Helena de Oliveira, Marcelo Affini e Augusto Fragelli

Há pouco menos de três anos, uma pesquisa realizada pela Escola Paulista de Medicina revelou um dado estarrecedor: no curtíssimo período de dois anos, o número de usuários de drogas entre estudantes brasileiros do 1° e 2° graus havia crescido 24%. De lá para cá, nada leva a crer que esse crescimento vertiginoso tenha cessado. Um dos motivos pode ser o fato de as raras campanhas antidrogas brasileiras visarem o mesmo alvo das campanhas realizadas em países desenvolvidos — as chamadas drogas pesadas, como a cocaína e o crack, as duas prediletas entre os jovens usuários americanos.

O crack é o primo pobre da cocaína, resultado da mistura desta com alguma substância básica, como soda cáustica ou bicarbonato de sódio. A combinação, além de baratear a droga — a qual, pura, vale tanto ou mais do que o ouro —, faz com que ela se cristalize. Os cristais podem ser fumados, enquanto a cocaína em pó se decompõe quando aquecida. É ótimo que se continue martelando o perigo dessas drogas nas salas de aula: tanto o crack como a cocaína podem causar a morte de quem as experimenta pela primeira vez (veja a reportagem Drogas, uma viagem pelo corpo humano, SUPERINTERESSANTE ano 5, número 3). Basta exagerar alguns microgramas na dose suportável pelo organismo, que varia de pessoa para pessoa, para desencadear convulsões cerebrais fatais. Além disso, drogas injetáveis como a cocaína e a heroína — cujos viciados são raríssimos no Brasil — trazem consigo o terrível fantasma da contaminação pelo vírus da Aids, ao se compartilharem seringas na ânsia de aproveitar a última gotícula da substância.

A questão porem, é que apenas um em cada 200 estudantes experimentou cocaína. Dos 30.000 entrevistados pelos pequisadores, 17% declararam que consomem inalantes, como a cola de sapateiro e o lança-perfume, os campeões da preferência nacional. Em segundo lugar vêm os tranqüilizantes, de que dependem 7% dos jovens participantes da pesquisa. “Isso é alarmante”, diz o médico Elisaldo Carlini, que coordenou o estudo. “Significa que as drogas mais consumidas no país não são ilegais e podem ser vendidas em farmácias ou armazéns de esquina.” De fato, o estudo da Escola Paulista de Medicina se resume a jovens na faixa entre 10 e 21 anos. Contudo, pelos dados das clínicas especializadas em tratar os dependentes de tóxicos, o problema não é muito diferente quando se fala em consumidores mais velhos: em média, sete em cada dez pessoas internadas nesses locais são alcoólatras. E, para beber álcool, não é preciso sequer receita médica.

A população adulta e dependente de drogas também costuma ser fiel consumidora de estimulantes e barbitúricos. “Quando se fala em prevenção da dependência, a maioria das pessoas se lembra dos adolescentes e se esquece da vovozinha que não dorme sem engolir um tranqüilizante”, destaca o médico Roberto Wüsthof, da Santa Casa de São Paulo. Aos 24 anos, pele bronzeada, ele tem a imagem de quem esbanja saúde à custa de muito esporte. Recém formado, com intenção de se especializar no tratamento de adolescentes — uma área da Medicina pouco explorada no Brasil, a seu ver —, Wüsthof começou a integrar programas antidrogas há quatro anos. Sempre estou organizando cursos e palestras sobre o tema nas escolas”, conta. “Isso porque, na minha opinião, a saída do beco da dependência é dificílima. Melhor do que investir nos diversos tratamentos é reforçar as campanhas de prevenção.”

A maconha, terceira colocada na preferência dos usuários de tóxicos brasileiros, ocupa em compensação o primeiro lugar em polêmica, por sua discutível dependência física. Do mesmo modo, está provado que a substância é incapaz de provocar morte por overdose. Nem sequer ela pode ser associada com a violência — um erro comum entre leigos —, pois seu efeito de ser um potente relaxante muscular e depressor do sistema nervoso costuma impedir que os usuários se metam em brigas. Quando isso eventualmente acontece, eles apanham feio. Contudo, quem quer fumar um baseado deve tocar em algum ponto da intrínseca rede da marginalidade para consegui-lo, pois que é uma substância proibida.

Alguns estudos apontam o caso dos usuários de maconha como principal argumento na defesa da descriminação das drogas. Há quem acuse os traficantes de serem os únicos que lucram com a ilegalidade. A Máfia, por exemplo, teve uma expressiva expansão enquanto vigorou a Lei Seca nos Estados Unidos, entre 1919 e 1933, quando a venda de bebidas alcoólicas era proibida.

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Nenhum cientista defensor da descriminação, no entanto, está afirmando que a maconha não prejudica a saúde. “Ela pode diminuir ou até interromper a produção de espermatozóides no homem, exemplifica Wüsthof. Contudo, não acho que a descriminação legal aumentaria o consumo da droga. O crescimento seria aparente porque as pessoas teriam coragem de se declarar consumidoras. Por outro lado, do ponto de vista da prevenção, que é a raiz do problema, essa medida não ajudaria em nada. Acho simplista a explicação da que o adolescente procura uma droga pelo prazer de fazer algo ilegal.” Defensor declarado da descriminação, o professor Elisaldo Carlini, da E. P. M., afirma que, nos países em que ela existe, como na Holanda. o consumo de tóxicos permaneceu estável: “E um absurdo fichar como criminoso o jovem que experimentou a maconha. O efeito dessa ação costuma ser mais tóxico do que a droga.”

A briga pela descriminação é antiga e já se travaram vários rounds. Em novembro passado ao concluir um parecer sobre o uso de entorpecentes pela população, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara dos Deputados não tocou nesse ponto. Em compensação, na tentativa de adequar a lei à realidade dos usuários no país, apontou o perigo das chamadas drogas lícitas vendidas em farmácias. A CPI também acusou o governo de não destinar dinheiro suficiente para o combate ao narcotráfico: para essa verdadeira guerra, a Policia Federal dispõe de 2 milhões de dólares anuais, quando seria necessária uma verba cerca de 24 vezes maior para uma repressão eficaz.Um dos pontos mais importantes do anteprojeto da lei de tóxicos. apresentado pela CPI, é a suspensão do processo penal para o simples usuário — que hoje pode passar de seis meses a dois anos na cadeia por carregar drogas no bolso —, se a pessoa se comprometer a não repetir a experiência, caso não seja diagnosticada a dependência, ou a se submeter a um tratamento médico, ambulatorial ou não. “Isso até pode ser um estimulo para largar o vício”, avalia o psicólogo paulista Luciano Costa Chati, embora o tom da voz não demonstre convicção. “Na realidade, um tratamento só pode dar certo quando não é imposto. A decisão tem de ser do próprio dependente”, afirma, gesticulando muito, confiante nessa tese.

Formado há quatro anos, desde os tempos de estudante Chati já esteve ligado ao trabalho de diversas clínicas para toxicômanos. Durante os dois anos em que viveu em Londres, aproveitou para conhecer de perto os estudos dos especialistas ingleses. “Lá, eles enfatizam uma linha de tratamento conhecida por dinâmica, preocupada em levar o drogado a. rever seu papel na família e na sociedade”, conta. “Existe ainda outra corrente, rotulada comportamentalista, preferida pelos americanos. Nesse caso, o paciente passa por uma desintoxicacão, com a substituição de estímulos, ou seja, a troca da droga por outra substância que não cause dependência, capaz de driblar o organismo enquanto se diminui a ingestão do tóxico.”

Para Chati, contudo, o segredo do sucesso é sempre o diagnóstico: “No inicio da carreira, recebi um paciente com a indicação de ser esquizofrênico. Demorei certo tempo até notar que, na realidade, o rapaz era um dependente de drogas”, recorda. “Na época, o caso me deixou abatido. Hoje em dia sei que esse erro é mais comum do que se imagina, embora isso não sirva de consolo.” Seja qual for a linha de tratamento, uma vez constatada a dependência, arenas um em cada dez Pacientes consegue abandonar o vício; ainda assim, os raros casos de recuperação costumam implicar uma constante autovigilância. “As chances do êxito variam conforme o tóxico envolvido”, explica o médico Anthony Wong, presidente da Associação Brasileira de Toxicologia. “Nesse sentido, os opiáceos, como a heroína, são os piores.”

Segundo ele, o ambiente em que o paciente vive é fundamental. “Se os pais bebem ou fumam, as estatísticas mostram que os filhos têm três a quatro vezes mais probabilidades de se tornarem viciados em algum tipo de droga. “A psicóloga Lidia Rosenberg Aratangy recorda a importância da família, embora sua abordagem seja diferente. Na sua opinião, mais do que o eventual exemplo dos pais, o que importa são as chances de uma criança liberar suas emoções. “O sentimento propulsor, que conduz alguém a experimentar uma droga, é entrar em contato com o mistério ou o desconhecido, como o explorador”, diz ela. “Isso é típico de quem gostaria de viver mais de uma vida. Na realidade, essa angústia não é nada do outro mundo; a maioria das pessoas a possui, mas a supera com coisas simples, como ler um livro com tamanha empolgação a ponto de se imaginar na pele da personagem”, explica Lídia. “O dependente de drogas, porém, geralmente é uma pessoa reprimida na infância, que não aprendeu a liberar esse impulso, o da paixão. Então, o tóxico abre a brecha.”

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Para a psicóloga, é essencial mostrar ao dependente que largar o vicio não significa abrir mão dessa vontade de não se limitar a uma única pele, própria do ser humano. “No mais, qualquer tratamento é válido, desde que apresente resultados. Não adianta questionar o médico de uns ou de outros: os Alcoólicos Anônimos, por exemplo têm um modo muito peculiar de trabalhar e conseguem excelentes resultados.” Lidia se refere a uma entidade sem fins lucrativos, fundada há 54 anos, que atualmente se espalha por 136 países. O programa dos A. A. se inicia quando o integrante reconhece a sua condição de dependente. A partir dai, durante três meses passa a freqüentar encontros, em que os participantes fazem depoimentos de sete a oito minutos sobre suas dificuldades como alcoólatras. Cada discurso é encerrado com a saudação “24 horas”, que significa um dia inteiro de sobriedade.

Em São Paulo, numa espaçosa casa à beira da represa de Guarapiranga, no bairro de Interlagos, a Clínica Vila Serena é um exemplo nítido da influência dos Alcoólicos Anônimos. “Aqui, recebemos muitos pacientes funcionários de empresas multinacionais, que apóiam o tratamento”, conta John Burns, americano ex-alcoólatra que fundou a clínica. Há treze de seus 61 anos, ele não coloca uma gota de álcool na boca. E, com bons motivos, orgulha-se: “A dependência do álcool é das mais difíceis de se recuperar. É mais produtivo tentar evitar o vicio nos filhos dos dependentes”: Por isso mesmo, na Vila Serena — que não trata apenas de alcoólatras — existem grupos anônimos para familiares de dependentes.

“Um drogado, quando se recupera, nunca volta a ser a mesma pessoa de antes”, constata o padre jesuíta Haroldo Rahm, de 72 anos, americano naturalizado brasileiro desde que chegou ao país, há quase três décadas. Na clínica que fundou há treze anos, a Fazenda do Senhor Jesus, cerca de cinqüenta homens, entre 17 e 45 anos, tentam se curar da dependência à química por meio da laborterapia, ou seja, do trabalho duro e pesado — 70 % dos recuperandos, como prefere chamá-los o carismático jesuíta, são portadores do vírus da Aids. “A maioria dos jovens são polidrogados, isto é, consomem álcool e cocaína, esta injetável”, explica. Os internos fazem desde serviços domésticos até trabalho na lavoura, em que empunham a enxada para cuidar de plantações de café, feijão, milho, arroz. “Ocupar-se é dar um sentido à vida, diferente de buscar uma nova dose de droga”, acredita o padre Rahm.

Hoje em dia, contudo, cerca de seis em cada dez dependentes de droga brasileiros não têm acesso a clínicas como essas: são os meninos de rua, viciados em inalantes como massa plástica e cola de sapateiro. Os solventes usados nesses produtos, como a benzina, são substâncias capazes de alterar a consciência, atingindo simultaneamente diferentes regiões cerebrais, segundos depois de inaladas. O uso crônico desses gases provoca perda irreversível da memória, devido a lesões nos centros nervosos do cérebro, e fraqueza muscular, ao destruir os chamados nervos motores, responsáveis pelos movimentos. Os órgãos que mais sofrem, porém, são os pulmões — eles são literalmente corroídos pelos inalantes, a ponto de não serem vistos numa radiografia do tórax .

Para saber mais:

Drogas, uma viagem pelo corpo humano

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(SUPER número 3, ano 6)

Quando a maconha cura

(SUPER número 8, ano 7)

Caça ao pó

Num pais de muito tráfico e pouco consumo, a polícia tem conseguido apreender quantidades cada vez maiores de droga, embora trabalhe em condições precárias

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Quando não está viajando, como representante brasileiro em dezenas de encontros internacionais sobre repressão às drogas, o delegado Paulo Gustavo de Magalhães Pinto passa a maior parte do tempo em uma sala confortável e agitada no prédio da Polícia Federal em Brasília. É dali, na função de diretor da Divisão Nacional de Repressão a Entorpecentes, que o delegado comanda a ação de policiais, espalhados pelo pais inteiro, especializados em combater o poderoso narcotráfico. Fazendeiro nas horas vagas, ele fala com segurança sobre as mudanças que acompanhou nos últimos dezesseis anos, a começar pelo preparo técnico cada vez melhor dos policiais. Uma prova disso é que com um número pequeno de homens — o qual chega a ser um absurdo —, a Divisão tem realizado apreensões de tóxicos cada vez maiores e mais freqüentes, nos últimos anos.

SUPER — Como o senhor vê o aumento no consumo de drogas no Brasil?

M. P.— Ninguém pode negar o crescimento no número de dependentes brasileiros. Mas, embora isso seja preocupante, a situação no Brasil está longe de ser desesperadora. Este é um país de transito entre os grandes produtores de droga — Peru, Colômbia e Bolívia — e os grandes consumidores, que são os países com moeda forte, como os Estados Unidos. Por mais que aumente a produção de drogas em outros países, como de fato parece estar acontecendo, eles não têm interesse de vendê-la ao Brasil, onde a maioria da população não tem dinheiro para comprá-la. Aqui, fica apenas o que chamamos de poeira: uma ínfima porção da droga em transito, cuja venda serve de salário, digamos, a quem ajuda essa mercadoria a atravessar um pais, rumo aos consumidores ricos dos outros continentes.

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SUPER .— Por que o Brasil é uma excelente escala para o narcotráfico?

M. P.— Em primeiro lugar, por causa da grande extensão territorial, com mais de 17 500 quilômetros de fronteira seca (que não dá para o mar). Isso multiplica as possíveis portas de entrada e os caminhos da droga pelo país. Se traçássemos todas as rotas usadas pelos traficantes, elas cobririam o desenho do mapa do Brasil. Além disso,o país possui uma excelente estrutura de comunicação, que facilita as negociações internacionais dos traficantes, aqui, quem deseja ligar para alguém da China pega o telefone e fala. Na Bolívia, por exemplo, tem de se esperar um tempo enorme para se conseguir uma ligação para a cidade vizinha.

SUPER — O Brasil não produz nenhum tipo de droga?

M. P.— Existe uma pequena produção de epadu, a similar brasileira da planta da coca, na região da Amazônia. Além disso, no Nordeste, especialmente na Bahia, encontram-se plantações de maconha, que nós estamos destruindo aos poucos, com a ajuda até de satélites capazes de localizá-las. Essa maconha, porém, é para consumo interno. Nenhum outro país quer importá-la, porque sua qualidade é inferior à da erva plantada, por exemplo, no Paraguai.

SUPER — A polícia é mais severa conforme o tipo de droga apreendida?

M. P.— Absolutamente não. A legislação não faz distinção entre os diversos tipos de drogas. E mesmo no que diz respeito ao Poder Judiciário, quando o caso é levado aos tribunais, é considerada somente a quantidade de determinado tóxico, que pode ser desde cocaína até remédio para regime vendido sem autorização médica.

SUPER — E qual a diferença do tratamento que a policia dá a um viciado e a um traficante?

M. P. — A princípio nenhuma: a polícia somente lavra o flagrante e, em 24 horas, entrega o caso à Justiça. Mas é bom esclarecer que não existem mais aqueles policiais com armas expostas e cigarros no canto da boca. Quando pega mos um traficante, graças às investigações preliminares, sabemos exatamente com quem estamos lidando. Quanto ao viciado, os policiais não os tratam como bandidos; mas também não os tratam como pessoas doentes, porque policiais não são médicos.

SUPER — E como, no caso, a Justiça diferencia o simples consumidor do traficante?

M. P.— Pelos antecedentes e pela quantidade da droga apreendida com a pessoa. O consumidor pode pegar uma pena de seis meses, se não pagar fiança. Eu estou, no entanto, há muitos anos nessa área e nunca vi um consumidor ficar esse tempo na cadeia. É por isso, aliás, que a maioria dos traficantes carrega pequenas quantidades de tóxicos. Assim, quando são flagrados, alegam ser dependentes e escapam. Essa é uma questão delicada, portanto.

SUPER — Como, então, a Policia Federal faz com os traficantes?

M. P.— Por incrível que pareça, a polícia brasileira é considerada uma das melhores do mundo no combate ao narcotráfico. A maioria dos agentes está sempre fazendo cursos no exterior, se especializando nesse jogo de paciência que são as investigações. A repressão aos narcotraficantes, por sua vez, é feita com a ajuda de troca de informações com policiais de vários países, especialmente Estados Unidos, França, Itália, Canadá, Espanha, Inglaterra e Suíça. Com tudo isso, porém, nossos resultados continuam limitados. Em primeiro lugar, porque há sete anos, enquanto o narcotráfico aumentou, não de realizaram concursos para a Policia Federal. Ou seja, para cobrir o Brasil inteiro, eu conto apenas com 500 homens especializados — no Rio de Janeiro, por exemplo, não devem existir mais do que dez desses agentes. E, para agravar, a lei limita ainda mais a ação da polícia.

SUPER — Por que a lei atrapalharia a repressão aos traficantes?

M. P. — A legislação, no que diz respeito às drogas, é de 1976 e precisa ser atualizada. A lei não dá aos nossos policiais o poder de barganha que possuem os policiais americanos, por exemplo. Nos Estados Unidos, a pena de um traficante é diminuída quando ele entrega outros traficantes. Sem contar que, hoje em dia, no Brasil, precisamos da autorização de um juiz antes de realizar uma busca ou usar uma escuta telefônica. Nesse meio tempo, o traficante escapa.

SUPER. — A maioria das pessoas sabe onde é possível conseguir maconha ou cocaína. Porque a policia ignora esses pontos de venda?

M. P. — Justamente porque a Divisão de Repressão a Entorpecentes possui pouquíssimos funcionários. Na minha opinião, seria um desperdício mandá-los para os pequenos pontos de venda ou bocas de fumo, como esses locais são conhecidos. O melhor é concentrá-los nas grandes apreensões. Afinal, toda vez que prendemos uma quadrilha, estamos tirando cerca de cinqüenta bocas de fumo do mercado, ao interromper o fornecimento de drogas. Mesmo assim, eu diria que acabamos esbarrando nesses pequenos traficantes. Eles acabam representando cerca de 80% das prisões que realizamos. Mas isso não dá Ibope e a população fica sem conhecimento do nosso trabalho. Nenhum jornal quer publicar que a policia apreendeu 1 ou 2 quilos de cocaína aqui e acolá.

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