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Como se consegue a concessão para operar um canal de TV no Brasil?

Para ficar com um canal, a emissora precisa cumprir uma série de pré-requisitos – como ter no mínimo 70% de seu capital na mão de acionistas brasileiros.

Por Felipe Van Deursen
Atualizado em 22 fev 2024, 11h25 - Publicado em 18 abr 2011, 18h34

Nenhuma emissora de TV brasileira é dona do canal em que sua programação é transmitida: todos os canais de sinal aberto pertencem ao Estado e são concedidos (daí a palavra “concessão”) temporariamente às emissoras, através de processos de licitação. Para concorrer a uma concessão, a empresa deve ter no mínimo 70% do capital nas mãos de acionistas brasileiros e respeitar o limite de controle de até dez estações em todo o país, sendo no máximo duas por estado e cinco em VHF (não entram na conta as retransmissoras).

Aí uma comissão do Ministério das Comunicações analisa sua proposta de programação e sua condição técnica e financeira, dando pontos em diferentes quesitos. Quem tiver a melhor média de pontos fica com a concessão, ganhando o direito de explorar determinado canal por um período pré-definido e, ao final dele, passa por uma nova análise.

Caso o Estado, através do ministério, constate que uma emissora fez uso do canal para fins diferentes dos que se esperava dela, pode se recusar a renovar a concessão. Foi exatamente igual ao que aconteceu na Venezuela em 2011: o presidente Hugo Chávez acusou a emissora RCTV de “não servir ao povo”, o Tribunal Supremo de Justiça aceitou os argumentos do presidente e a emissora foi tirada do ar.

Durante o regime militar no Brasil, houve casos de concessões cassadas, mas o motivo alegado sempre foi o do endividamento das empresas, embora tenham ocorrido perseguições políticas. O assunto voltou à tona em em outubro de 2019, quando o presidente Jair Bolsonaro ameaçou não renovar a concessão da Globo em retaliação ao fato de que o Jornal Nacional associou seu nome ao assassinato de Marielle Franco.

Geradoras, afiliadas e retransmissoras

O funcionamento de uma rede de televisão baseia-se na divisão de tarefas entre três tipos de estação: geradoras, afiliadas e retransmissoras. Todas precisam de uma concessão da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) para gerar e transmitir programação televisiva, embora, em geral, somente as primeiras sejam de propriedade das grandes emissoras (Globo, SBT, Bandeirantes etc.).

Afiliadas e retransmissoras são empresas independentes que, depois de receber a concessão, associam-se a uma emissora para levar a programação dela a locais onde o sinal das geradoras não chega. Algumas emissoras têm apenas uma geradora, onde é produzido todo o conteúdo de caráter nacional (as novelas e os principais telejornais, por exemplo).

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Outras têm mais de uma geradora e dividem a produção dos programas nacionais entre elas. As regiões que contam com geradoras recebem o sinal direto delas, mas, para chegar mais longe, o sinal é mandado para um satélite, que o rebate para as afiliadas. Elas pegam a programação nacional, acrescentam alguns programas produzidos por elas e transmitem esse novo sinal para as casas da sua região e para as estações retransmissoras, que não produzem nenhum programa, mas levam mais longe a programação das afiliadas.

Cada um na sua
Três tipos de estação compõem uma rede. Veja qual é o papel de cada uma.

Geradoras
São as estações principais, que produzem todo o conteúdo nacional. A Rede Globo é dona de cinco geradoras – em Belo Horizonte, Brasília, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo – mas a do Rio é a que centraliza o conteúdo produzido pelas demais

Afiliadas
Estão instaladas nas capitais que não têm geradoras e nas cidades medianas. Repassam o sinal de uma emissora, mas, por lei, precisam preencher uma parte da sua programação com conteúdo regional. A Globo tem 116 afiliadas, onde são produzidos os jornais locais, como MSTV, RSTV etc.

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Retransmissoras
Localizadas nas cidades menores. Apenas repetem o conteúdo transmitido pelas afiliadas para que o sinal alcance todas as residências dentro da área de cobertura

Plim-plim

Veja como a Rede Globo é capaz de levar uma notícia do Mato Grosso do Sul ao Pará em menos de 1 segundo. Usamos um exemplo de brincadeira.

1. Às 4 h da madrugada – 5 h, em Brasília – rola um boato de que Osama bin Laden foi visto pescando no Pantanal, na região de Corumbá (MS). Pessoas que trabalham na retransmissora local ouvem o boato e avisam a redação da afiliada mais próxima, a TV Morena, em Campo Grande.

2. O homem que supostamente alugou o barco para Osama aceita dar uma entrevista e a TV Morena envia um repórter a Corumbá a bordo de um furgão equipado com link para transmissão ao vivo, via satélite. Às 10h40 – 11h40, em Brasília – a entrevista entra ao vivo no jornal local, o MSTV

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3. Informados sobre a notícia do jornal regional, a Central Globo de Jornalismo, no Rio de Janeiro, entra em contato com a equipe de Campo Grande e combina a inserção do material no Jornal Nacional. A matéria, bruta ou editada, pode ser enviada para a geradora do Rio via internet.

4. Às 20h30, direto do estúdio do JN, no Rio, William Bonner anuncia imagens inéditas da “pescaria do terror”. O sinal do telejornal é enviado para o espaço e chega quase que instantaneamente a um satélite. De lá é “pulverizado” para as estações afiliadas de todo o Brasil.

5. O sinal do satélite é recebido pela TV Liberal, a afiliada de Belém. Ela transmite o JN para residências de Belém e reenvia o sinal, novamente por satélite, para algumas retransmissoras paraenses. Outras estações, contudo, recebem o sinal pela malha terrestre mesmo – de antena para antena.

6. O JN chega à retransmissora de Itaituba, uma cidade no interior do Pará. O povo de lá fica sabendo das férias de Osama praticamente no mesmo momento que o pessoal de Belém e do Rio: o sinal demora menos de 1 segundo para chegar a qualquer telespectador brasileiro. Mas, por causa do fuso horário, lá são 19h30, e no Rio, 20h30.

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Chegar, chega

A teia formada pelas redes de TV chega longe, mas não a todas as cidades do Brasil. Nos locais aonde nem o sinal das retransmissoras chega, o jeito é instalar uma antena parabólica, que capta a programação nacional direto do satélite, sem os comerciais regionais. Por isso, na hora do intervalo, a tela fica preta.

Confuso horário

As afiliadas têm estratégias para lidar com o fuso horário. O Mais Você, da Globo, rola ao vivo às 8h05 em São Paulo, mas é gravado para ir ao ar às 7h40 em Campo Grande (MS) – 8h40 em São Paulo. Daí em diante a programação sofre pequenos ajustes para deixar a rede sincronizada às 11h25 – 12h25 em São Paulo –, no Jornal Hoje.

Vamos faturar

Se uma empresa quer anunciar um produto no país inteiro, ela deve negociar direto com a emissora – que também vende anúncios regionais. Mas a venda de espaço publicitário não é exclusividade da emissora: afiliadas também vendem reclames, mas só podem veiculá-los dentro da sua área de cobertura.

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