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Papo de gênios: Einstein e Freud trocaram cartas em busca da paz mundial

Há nove décadas, o pai da relatividade convidou o pai da psicanálise a um debate contra a guerra. Mas o homem do divã achava o conflito inevitável.

Por Alexandre Carvalho
Atualizado em 13 jan 2023, 18h20 - Publicado em 19 jan 2022, 19h42

Agora em 2023, uma das trocas de ideias mais extraordinárias da história fará 91 anos. Foi em 1932 que, numa iniciativa da Comissão Permanente de Letras e Artes da Liga das Nações (órgão que viria a ser substituído pela ONU em 1945), Albert Einstein foi convidado a debater, por carta, com um interlocutor que ele escolhesse, sobre algum tema de interesse geral do planeta. 

O físico então quis tratar das razões psicológicas que levam os países a conflitos armados. E, se o assunto passava por motivações da mente humana, passava também, na época, por Sigmund Freud – que, com mais de 70 anos, já era considerado um gigante do pensamento moderno. A psicanálise havia conquistado o mundo desde que o homem dos charutos realizou, em 1909, uma série de palestras nos Estados Unidos, onde suas teorias do inconsciente e a psicoterapia que inventou viraram uma febre.

Juntar dois dos maiores gênios do século 20 para procurar caminhos que evitassem novas matanças entre países rivais fazia todo o sentido naquele período – pois o planeta estava em ebulição.

A Primeira Guerra havia terminado só 14 anos antes, deixando 10 milhões de mortos e uma Alemanha derrotada e humilhada, ansiosa por ouvir discursos populistas que prometessem romper com as restrições do Tratado de Versalhes: pelo acordo imposto, os alemães tiveram de ceder parte de seu território, ficou proibida de possuir Marinha e Força Aérea (com um Exército restrito, quase simbólico) e ainda foi obrigada a pagar uma fortuna de indenização por conta dos prejuízos causados pela guerra. Hitler não surgiu do nada, portanto. Naquele mesmo 1932, o Partido Nazista elegeria 230 deputados e se tornaria o segundo com maior representação no Parlamento.

Freud não era otimista

Nesse período de muito discurso de ódio, revanchismo e instabilidade no cenário internacional, Einstein, um pacifista declarado, foi buscar “esclarecimento psicológico” com o colega investigador da mente. 

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Sua carta levava as seguintes indagações:

“Existe alguma maneira de livrar a humanidade da ameaça da guerra? É do conhecimento geral que, com o avanço da ciência moderna, essa passou a significar uma questão de vida e morte para a civilização como a conhecemos.

(…)

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Meu pensamento não permite discernir os lugares escuros da vontade e do sentimento humanos. Assim, posso fazer pouco mais do que procurar esclarecer a questão  e, limpando o terreno das soluções mais óbvias, permitir que você traga à luz seu amplo conhecimento da vida instintiva do homem para lidar com o problema. Há certos obstáculos psicológicos cuja existência um leigo nas ciências mentais pode vagamente supor, mas cujas interrelações e caprichos ele é incompetente para entender. Você, eu estou convencido, será capaz de sugerir métodos educativos.”

A mensagem prosseguiu nessa linha, dizendo que Freud talvez tivesse a resposta para entender a vontade de matar e morrer que sempre existiu entre os homens. Mas a resposta veio impregnada pelo pessimismo que marcava o pensamento freudiano a respeito da felicidade e das relações humanas.

“Vigora no homem uma necessidade de odiar e aniquilar. Tal predisposição, em tempos normais, apresenta-se em estado latente e só vem à tona no anormal. Mas ela pode ser despertada com relativa facilidade e se intensificar em psicose de massa.”

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Diante de uma declaração que mais parecia confirmar que a guerra era uma extensão da nossa essência, Einstein pediu mais explicações ao pai da psicanálise. A nova resposta veio em forma de um manifesto político, “Warun Krieg” (“Por que a guerra?”), em que Freud mantinha sua tese de que “não há perspectiva de abolir as tendências agressivas do ser humano”, mas manifestava a teoria de que, se temos uma energia mental voltada à destruição, temos também outra que busca a união dos povos – seu postulado de “pulsão de vida”, que compensaria nossa “pulsão de morte”, autodestrutiva e violenta. 

Deixando uma pequena fresta para o otimismo que esse debate público poderia gerar, Freud escreveu que um possível caminho para evitar a guerra passaria por manter internalizada essa energia destrutiva e dar espaço ao impulso que associou a Eros, o deus do amor na mitologia grega. Segundo a psicanálise, é essa pulsão de vida que nos leva a formar laços emocionais com as pessoas e desenvolver a empatia. 

Dois antídotos importantes contra a carnificina entre nações.

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