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O que o Estado Islâmico quer?

Desde 2006, o Estado Islâmico já conquistou 190 mil quillômetros quadrados, decapitou “infiéis” e destruiu patrimônios da humanidade – transmitindo tudo online. Recentemente, executou centenas em um ataque coordenado a Paris. Afinal, o que o ISIS quer além de tocar o terror e chamar a atenção do mundo?

Por Felipe Germano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 4 nov 2016, 19h02 - Publicado em 23 nov 2015, 12h45

Na última sexta-feira 13 de 2015, Paris virou cenário de filme de terror. Na verdade, de um sangrento reality show. O Estado Islâmico (ISIS) dirigiu ações coordenadas de homens-bomba e atiradores em vários pontos da capital francesa. Até o fechamento desta edição, eram 129 mortos, de 17 países, e mais de 350 feridos. Foi o segundo atentado do grupo à França no ano – em janeiro, na redação do jornal Charlie Hebdo, 12 pessoas foram executadas.

Pouco antes do ataque parisiense, o ISIS abateu um avião russo que sobrevoava o Egito e explodiu dois homens-bomba em Beirute, capital do Líbano. Nada disso é isolado de um plano maior. O ISIS, que nasceu na primeira década dos anos 2000, é mais que uma mera organização terrorista. Hoje, se afirma como um Estado e, ainda que não seja reconhecido por outras nações, funciona como um. Eles têm território controlado, exército, cobrança de impostos (provavelmente a maior fonte de renda do governo), comércio (ênfase no contrabando de petróleo) e prestação de serviço aos “cidadãos”. Estabilizado como poder paralelo, parece estar iniciando uma ofensiva sistemática para cutucar os inimigos e convocá-los para o combate.

Em carta, o ISIS comemorou o ataque à “capital da prostituição e da obscenidade, (…) pelo qual Alá é todo louvor e gratidão”. Ao fim do texto, uma ameaça: “esse ataque foi o primeiro de uma tempestade e um aviso àqueles que quiserem aprender”. Mas até onde vai a tempestade? O que o ISIS quer, de fato, com atentados espetaculares em nome da fé? Nas próximas páginas, explicamos as principais razões que norteiam este Estado de guerra.

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1. Vingança

Os militantes do ISIS atribuem a desavença com o Ocidente a um passado distante: às sangrentas Cruzadas medievais, que espalharam terror pelo território islâmico. Mas, apesar dessa guerra religiosa ter sido mesmo marcante, na verdade, muçulmanos e cristãos conviveram pacificamente durante boa parte da história.

Só que os conflitos políticos entre os dois mundos se acirraram. Alguns árabes se ressentem da influência europeia e americana em suas questões nacionais – inclusive na delimitação das suas fronteiras, que foram definidas por França e Reino Unido após a 1ª Guerra. Sem falar da cobiça ocidental pela região, que é rica em petróleo, gás natural e pedras preciosas, o que resulta em frequentes invasões e investidas pela dominação do território.

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Um dos objetivos do Estado Islâmico é dominar o Oriente Médio, impedindo que os países ocidentais continuem donos de tanto poder na região. Na época de Saddam Hussein, que governou o Iraque entre as décadas de 1980 e 2000, o país era uma das áreas mais poderosas e importantes do mundo árabe, graças às riquezas naturais e às vantagens de possuir um Estado laico. Quando os EUA invadiram o país, em 2003, alegando a existência de armas de destruição em massa, exigiram o desmembramento do exército local. Muitos desses soldados treinados, que entraram para diferentes grupos armados, hoje estão no Estado Islâmico. Natural que tenham os americanos em sua lista de inimigos a combater.

Mas por que tantas investidas contra a França? Milhões de muçulmanos residem na França e são tratados como cidadãos de segunda. Isso irrita essas pessoas. A maioria dos terroristas envolvidos no ataque a Paris eram franceses ou belgas, que são vizinhos da França. Outro motivo seriam os 200 bombardeios franceses a posições do ISIS no Iraque desde setembro de 2014. E, claro, valores. Os ataques de um Estado paralelo e totalitário ao berço do Iluminismo é simbólico: uma afronta à democracia moderna.

2. Dominação

O Estado Islâmico já é, de fato, um Estado. Não no sentido de país reconhecido pela ONU, mas como um espaço autônomo, com autoridades e leis próprias. A Constituição é a Sharia, sistema de leis baseado em uma interpretação estrita do Corão, livro sagrado do Islã. Isso significa que: ladrões pegos em flagrante devem ter suas mãos cortadas; crucificar é uma forma legítima de executar infiéis; mulheres de inimigos podem ser escravizadas; e estrangeiros só podem viver se pagarem impostos especiais e se admitirem ser inferiores aos muçulmanos. Isso tudo é lei nos domínios do ISIS.

O império deles é o califado, zona comandada desde 2014 por Abu Bakr al Baghdadi, líder que clama ser sucessor de Maomé. Ele não foi eleito, mas autoproclamado. 

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Atualmente, o Estado Islâmico domina um território que faz parte de Síria e Iraque. Segundo levantamento do exército dos EUA, a área ultrapassa 190 mil km² – aproximadamente o tamanho do Paraná. A intenção é só crescer. O ISIS não reconhece qualquer tipo de autoridade. Por isso, não hesita em invadir territórios de outros Estados. 

Em seu livro Empire of Fear: Inside the Islamic State (Império do Medo: Por dentro do Estado Islâmico, não lançado no Brasil), o jornalista Andrew Hosken traça um mapa da área que eles pretendem dominar até 2020. O plano é conquistar todo o Oriente Médio, o norte da África e países europeus como Portugal e França.

 

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Daqui a a 5 anos
Em 2020, o ISIS quer dominar toda esta área, que deve ser comandada pelo mesmo califa e reunir todos os muçulmanos do mundo. Atualmente, o Estado Islâmico se concentra entre a Síria e o Iraque.
isis superinteressante

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3. O Apocalipse

Hoje, a população sob comando do ISIS soma cerca de 8 milhões de pessoas. Mas o Estado Islâmico impõe que muçulmanos de todas as partes do mundo migrem para o califado, assim que ele seja consolidado. Os próprios membros da religião que não concordarem com pontos do governo, como os xiitas, devem ser mortos. 

Em comunicados, o ISIS proclama que seus ataques são uma forma de iniciar o fim dos tempos. Eles acreditam que uma grande batalha contra os infiéis dará início ao julgamento final, profetizado no Hadiz, um de seus textos sagrados. Um detalhe importante é que, segundo a interpretação da profecia, isso tudo aconteceria em Dabiq, na Síria, onde está localizada a base do ISIS. Após decapitar o agente humanitário Peter Kassig, em 2014, o executor disse “aqui estamos, enterrando o primeiro cruzado americano em Dabiq e esperando avidamente o resto de seus exércitos chegarem”. A mensagem deixa claro que o grupo quer atrair o inimigo até o seu território para a batalha final e invoca a morte de um falso messias. “Quando o inimigo de Alá vir Jesus, ele se dissolverá, assim como o sal se dissolve na água”, diz no Hadiz. Claro que o Estado Islâmico interpreta o texto do jeito mais conveniente. “A linguagem é muito simbólica. Os terroristas dão o tom que querem. Há quem defenda que essa batalha não é física, e sim uma metáfora sobre manter-se firme nas dificuldades pessoais e religiosas”, afirma Rodrigo Franklin, teólogo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Fora dos livros religiosos, os conflitos no Oriente Médio estão realmente detonando o mundo. Além da carnificina das execuções e dos ataques a monumentos, sobrou até para a natureza. Estudo publicado na revista Science Advances aponta que a qualidade do ar em países como Síria, Palestina e Egito está piorando drasticamente em consequência da queima de combustíveis em áreas de conflito. É o ISIS acabando com o mundo até mesmo quando não está pensando nisso.

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