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O mês de fevereiro já teve 30 dias?

A resposta é sim. Mas, para entender como isso aconteceu, é preciso entender a longa e caótica história dos calendários. Veja.

Por Carolina Fioratti
Atualizado em 5 fev 2021, 10h35 - Publicado em 21 fev 2020, 16h26

Pois é. Fevereiro é curtinho: tem 28 dias, ainda que ganhe um chorinho nos anos bissextos, quando passa a ter 29. Mas fevereiro já teve 30 dias? A resposta é sim; mas para entender melhor, é preciso ir por partes, porque isso se deve ao longo caminho percorrido na história dos calendários.

Primeiro, precisamos conhecer o calendário romano. Era uma folhinha que contava com dez meses, indo de março a dezembro (“setembro”, “outubro”, “novembro” e “dezembro” significavam o que os nomes deles indicam: mês sete, mês oito, mês nove e mês dez).

E eram só 304 dias. Os 61 dias restantes, que caíam no inverno, não pertenciam a mês nenhum. Um limbo temporal.

O calendário era lunar, ou seja, baseado nas fases da Lua. Um mês começava quando a lua crescente dava seu primeiro sinal de vida, e terminava ao fim do ciclo de quatro fases. Como os ciclos lunares duram 29,5 dias, convencionou-se que os meses deveriam durar entre 29 e 30 dias. 

O calendário foi reformulado ainda no início da civilização romana, por volta de 700 a.C. Adicionaram dois meses: janeiro e fevereiro, tirando o inverno do limbo.  

Agora o ano somava 355 dias. Quatro meses de 31 dias e sete meses de 29. Como fevereiro foi adicionado depois, acabou ficando com 28 dias para completar a conta.

Opa. Mas um ano propriamente dito tem 365 dias, certo? E isso não é uma “convenção social”. É astronomia. É o tempo que a Terra leva para dar uma volta em torno do Sol e pronto.

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As civilizações antigas, porém, não contavam com instrumentos astronômicos de precisão. Então davam um jeito de calibrar a contagem de tempo mais simples de medir (a das fases da Lua) com a contagem mais difícil de medir (a do tempo que a Terra leva para dar uma volta em torno do Sol). Então convencionaram que 12 ciclos completos da lua completavam um ano, certinho.

29,5 vezes 12 dá 354. Por algum motivo, os romanos arredondaram para 355.

Mas e aí? Onde vão parar os 10 dias que faltam? Vem comigo:

Se você resolver seguir o calendário romano, e adotasse um ano de 355 dias, aconteceria o seguinte. O ano de 2020 terminaria dia 21 de dezembro. 2021, acabaria no dia 11 de dezembro. E assim por diante, tal qual um relógio quebrado. Em 2030, noite de ano novo seria no dia 22 de setembro. Em 2040, no dia 14 de junho (no nosso inverno). Ou seja: o Ano Novo, e qualquer outra data, tipo o seu aniversário, corriam por todas as estações do ano.

Uma zona.

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Mais tarde, no século 1 a.C., os astrônomos romanos já tinham medido direitinho a duração de um ano: 365,25 dias. Mas a contagem, por tradição, ainda ficava nos 355 dias.

Até que, em 44 a.C., o ditador Júlio César decidiu acertar os ponteiros de Roma. Instituiu o ano de 365 dias, com um dia a mais a cada quatro anos, para a média dar 365,25. Gênio. Estava criado o Calendário Juliano. Agora, seriam seis meses de 31 dias, e cinco meses de 30 dias. Fevereiro teria 29 dias, sendo acrescentado um extra a cada quatro anos – o ano bissexto, necessário para fechar a conta. De quebra, ele decidiu se auto-homenagear pela façanha mudando o nome do velho quinto mês do ano (Quintilis) para “Júlio”. Julho, na grafia atual. Haja modéstia. 

Tudo muito bonito. Mas o Calendário Juliano tinha um probleminha… O ano NÃO dura 365,25 dias. Ele tem 365,2422 dias.

Pior. Após a morte de César, os anos bissextos passaram a ser contados a cada três anos. O imperador Augusto, sobrinho e sucessor de Júlio, decidiu abolir o dia extra entre os anos 12 a.C. e 8 d.C. E ainda faria mais uma reformulação. O fato é que Augusto era, digamos, um pouco ciumento. Ele não achava legal ter um mês em homenagem ao tio, e não um a ele próprio.

Então pegou o mês seguinte, o antigo Sextilis, para chamar de seu. Daí em diante, depois do mês de Júlio passou a vir o mês de Augusto – agosto. 

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Mas, como a quantidade de dias de cada mês é intercalada, agosto teria apenas 30 dias, enquanto julho possuía 31. Aquilo indicava que Augusto era menor do que Júlio César… “Assim não dá”, o imperador deve ter pensado.  

Então, Augusto deixou seu mês com 31 dias também, e tirou novamente um dia de fevereiro, que ficou apenas com 28. Recapitulando: a essa altura da história, tínhamos sete meses de 31 dias, quatro meses de 30 dias e fevereiro com 28 (ou 29 em anos bissextos). E foi assim que fevereiro ficou com menos dias. 

Mas a história continua. Lembra daquele probleminha do Calendário Juliano, o de ter 365,25 dias quando o ano, astronomicamente falando, tem 365,2422? Essa gerou um errinho de cálculo parecido com aquele do ano de 355 dias (ainda em que bem mais brando). Mas ainda assim era um relógio meio quebrado, já que todo ano atrasava um pouquinho. Esse pouquinho foi se acumulando, e virou um poucão: 1.500 anos depois, o mundo estava dez dias atrasado.

Então, em 24 de janeiro de 1582, o Papa Gregório 13 resolveu acertar os ponteiros de novo. Sua ideia era fazer com que o equinócio de primavera caísse exatamente no dia 21 de março (a data em que ela caía quando o calendário juliano ainda não tinha atrasado). Isso é fácil: você consegue medir com precisão o dia do equinócio da primavera, só de observar o movimento do Sol ao longo do ano. O lance, então, era puxar o 21 de março para esse dia. 

Para que isso acontecesse no ano de 1583, ele simplesmente cancelou os dias entre 05 e 14 de outubro de 1582. A quinta-feira (04) foi sucedida pela sexta-feira (15).  

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Os anos bissextos foram mantidos. No entanto, os anos seculares (último ano de cada século) só poderiam ser bissextos se fossem divisíveis por 400. Dessa forma, a conta que antes dava errado no calendário juliano, finalmente funcionaria de forma ideal. A média de duração dos anos daria rigorosamente 365,2422, como manda a natureza.

Com suas mudanças, o Papa Gregório 13 esperava que o calendário remodelado fosse adotado pelo mundo todo. Espanha, Itália, Portugal e Polônia foram os primeiros países a aderirem. Depois, ao longo de três séculos, todos os países ocidentais passaram a seguir o calendário gregoriano. 

Mas e aí? Existiu algum dia 30 de fevereiro?

Existiu! Primeiro foi na Suécia. Em 1700, o país pretendia adotar o calendário gregoriano, mas, para não fazer como o Papa e simplesmente ignorar dez dias, decidiu-se por uma medida bem mais suave: abolir todos os anos bissextos entre 1700 e 1740.

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(Wikimedia Commons/Domínio Público)

Mas, também em 1700, os suecos estavam entrando em sua Grande Guerra contra Polônia, Dinamarca e Rússia. Estavam com tanta coisa na cabeça que acabaram trocando as bolas. Eles ignoraram o dia bissexto de 1700, mas o contaram em 1704 e 1708. As datas estavam, então, fora de sincronia com os dois calendários. Uma confusão só. Com isso, em 1712, tiveram que regressar ao calendário juliano para resolver a situação. Adicionaram um dia bissexto neste ano: o glorioso 30 de fevereiro.

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Depois, em 1753, os suecos fizeram a migração oficial para o calendário gregoriano. Como o atraso dos dias se mantinha, decretaram que o dia 17 de fevereiro seria sucedido por 1º de março, ignorando os 11 dias que existiam no meio. 

A Suécia não foi a única a bagunçar o calendário. A União Soviética decidiu introduzir, em 1929, um “calendário revolucionário”. As semanas passariam a ter cinco dias e cada mês contaria com 30. Os cinco dias restantes seriam feriados espalhados pelo ano, mas não pertenceriam a um mês específico. O objetivo era alavancar a produção: pois os fins de semana deixariam de existir. Os soviéticos, então, também tiveram seu 30 de fevereiro em 1930 e 1931. Em 1932, o tal calendário foi abandonado. E com ele o dia 30/2 morreu para sempre. 

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