Antes de Trump: as tarifas mais absurdas da história dos EUA
O topetão é só mais um numa longa linhagem de presidentes apaixonados por taxas, que serviram de combustível até para a Guerra de Secessão.

Na quarta-feira (2), o presidente dos Estados Unidos Donald Trump anunciou uma nova estratégia de impostos sobre importações para vários países – que incidem até sobre ilhas habitadas exclusivamente por pinguins.
Vários territórios foram taxados em 10%, valor mínimo do tarifaço. No caso da China, a questão é mais complicada: o país asiático respondeu à taxação inicial de 34%, e agora Trump anunciou um novo imposto de 125%. O país de Xi Jinping anunciou taxas na mesma porcentagem.
Agora, Trump voltou atrás na ideia de tarifas para boa parte do mundo. É até difícil chamar a medida de protecionista: qual é o produto que os pinguins da Ilha Heard e das Ilhas McDonald estão produzindo que pode competir com a indústria americana? Ele pausou a aplicação das medidas por 90 dias, mantendo o imposto apenas sobre as importações chinesas.
O tarifaço uma guinada radical na política comercial dos Estados Unidos, que ajudou a estabelecer o mercado internacional atual, com a Organização Mundial do Comércio (OMC) e políticas liberais durante décadas.
Apesar disso, não é a primeira vez que uma guinada dessas acontece. Conheça as taxas mais absurdas da história, e os antecessores de Trump na arte de tarifar exorbitantemente.
Tarifaço é coisa velha
Em 1789, George Washington assinou o Tariff Act, que servia para taxar importações para financiar o jovem governo americano e fomentar a indústria incipiente do país. Desde então, as tarifas vem e vão, dependendo do presidente em ofício e do contexto econômico do momento.
O protecionismo não nasceu na terra do Tio Sam, mas na metrópole: as primeiras evidências de intervenções em importações são do século 14, quando o rei Eduardo III, da Inglaterra, proibiu a importação de lã para valorizar o produto nacional.
No começo do século 19, chegou a abominável Tarifa das Abominações. Essa lei de 1828 foi tão polêmica que levou a uma crise institucional severa e quase engatilhou uma guerra civil quando a Carolina do Sul declarou a taxação inconstitucional e acabou com os impostos abusivos no estado. E bota abusivos nisso: alguns bem importados chegaram a tarifas de 62%, com uma taxa-base de 38% para vários produtos.
“Tarifa das Abominações” foi o nome que alguns dos moradores do Sul deram à lei, que impactou muito a economia dos estados sulistas. Enquanto o Norte tinha uma manufatura incipiente e sofria com os preços baixos dos produtos do Reino Unido, o primeiro país a se industrializar, os sulistas, com sua economia de exploração, dependiam das bugigangas britânicas baratas.
Esse evento ajudou a pavimentar o caminho para a Guerra de Secessão, que estourou em 1861 entre o Norte e o Sul dos Estados Unidos. Depois da guerra civil, o protecionismo continuou intenso. A Tarifa McKinley, de 1890, subiu os impostos sobre importações para quase 50%, causando altas nos preços, mas eliminou as taxas de alguns produtos, como açúcar e café, para “garantir o comércio recíproco”. É a mesma expressão que Trump usa hoje, mas sem eliminar taxa de produto algum.
O outro ponto alto (com consequências bem baixas) das tarifas americanas foi a Lei Smoot-Hawley, de 1930. O presidente republicano Herbert Hoover achou que uma boa estratégia para resolver a Grande Depressão, a pior crise econômica da história do capitalismo, seria promulgar uma lei que aumentaria em 20% os impostos sobre mais de 20 mil produtos importados. Por causa de tarifas pré-existentes, algumas taxas chegaram a 60%.
Como a Super já explicou aqui, não deu certo. Outros países começaram a retaliar os Estados Unidos com seus próprios impostos proibitivos, o que ajudou a agravar a crise econômica mundial. Isso não quer dizer que Trump vai desencadear a Grande Depressão 2.0 com sua nova política comercial, mas também não é um bom presságio.
De acordo com o Laboratório de Orçamento de Yale, a média de tarifas dos Estados Unidos atualmente está em 22,5% para praticamente todos os produtos disponíveis, sem as discriminações de políticas fiscais anteriores. É a maior taxa efetiva desde 1909 – mas a diferença é que o governo dos Estados Unidos praticamente só tinham essa fonte de arrecadação na época, já que o imposto de renda foi proposto pelo presidente Howard Taft no mesmo ano.
Agora que as tarifas foram suspensas por 90 dias, não dá para saber se Trump vai levar as taxas que ele mesmo anunciou a sério. Talvez uma breve aula de história sobre as consequências de guinadas tarifárias passadas – crises institucionais, altas inflacionais e um aprofundamento da pior depressão econômica da história dos Estados Unidos – possa ajudar a dissuadir o presidente americano.