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A história do método Braile

O alfabeto Braile contribuiu efetivamente para a comunicação entre cegos, pois aplica-se a qualquer língua, à estenografia e à música.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h08 - Publicado em 30 abr 1989, 22h00

Silvio Atanes

Ler no escuro. Quem já tentou sabe que é impossível. Mas foi exatamente a isso que um francês chamado Louis Braille dedicou a vida. Nascido em Coupvray, uma pequena aldeia nos arredores de Paris, em 1809, desde cedo ele mostrou muito interesse pelo trabalho do pai. Seus olhos azuis brilhavam da admiração de vê-lo cortar, com extrema perícia, selas e arreios. Uma tarde, pouco depois de completar 3 anos, o menino começou a brincar na selaria do pai, cortando pequenas tiras de couro. De repente, uma sovela, instrumento usado para perfurar o couro, escapou-lhe da mão e a tingiu o seu olho esquerdo. O resultado foi uma infecção que, seis meses depois, afetaria também o olho direito. Aos 5 a nos, o garoto estava completamente cego.

A tragédia não o impediu, porém, de freqüentar a escola por dois anos e de se tornar ainda um aluno brilhante. Por essa razão, ele ganhou uma bolsa de estudos no Instituto Nacional para Jovens Cegos, em Paris, um colégio interno fundado por Valentin Haüy (1745-1822). Além do currículo normal, Haüy introduzira um sistema especial de alfabetização, no qual letras de fôrma impressas em relevo, em papelão, eram reconhecidas pelos contornos. Desde o inicio do curso, Braille destacou-se como o melhor aluno da turma e logo começou a ajudar os colegas. Em 1821, aos 12 anos, conheceu um método inventado pouco antes por Charles Barbier de La Serre, oficial do Exército francês.
O método Barbier, também chamado escrita noturna, era um código de pontos e traços em relevo impressos também em papelão. Destinava-se a enviar ordens cifradas a sentinelas em postos avançados. Estes decodificariam a mensagem até no escuro. Mas como a idéia não pegou na tropa, Barbier adaptou o método para a leitura de cegos, com o nome de grafia sonora. O sistema permitia a comunicação entre os cegos, pois com ele era possível escrever, algo que o método de Háüy não possibilitava. O de Barbier era fonético: registrava sons e não letras. Dessa forma, as palavras não podiam ser soletradas. Além disso, o fato de um grande número de sinais serem usado para uma única palavra tornava o sistema muito complicado. Apesar dos inconvenientes, foi adotado como método auxiliar por Haüy.

Pesquisando a fundo a grafia sonora, Braille percebeu suas limitações e pôs-se a aperfeiçoá-la. Em 1824, seu método estava pronto. Primeiro, eliminou os traços, para evitar erros de leitura: em seguida, criou uma célula de seis pontos, divididos em duas colunas de três pontos cada, que podem ser combinados de 63 maneiras diferentes. A posição dos pontos na célula é esta ao lado.

As primeiras dez letras do alfabeto de (a a j) são formadas com os pontos 1,2,4 e 5. Precedidos de um sinal especifico para indicar algarismos, os pontos adquirem valores numéricos, de 1 a 10. As letras de k a t resultam da adição do ponto 3 aos sinais das dez primeiras letras. Quando o ponto 3 e 6 são adicionados simultaneamente às cinco primeiras letras surgem os símbolos das letras u,v,x,y,z; o w é representado pelos pontos 2,4,5 e 6. Com as combinações restantes, de acordo com o idioma, surgem os sinais de acentuação e pontuação.
Em 1826, aos 17 anos, ainda estudante, Braille começou a dar aulas. Embora seu método fizesse sucesso entre os alunos, não podia ensiná-lo na sala de aula, pois ainda não era reconhecido oficialmente. Por isso, Braille dava aulas do revolucionário sistema escondido no quarto, que logo se transformou numa segunda sala de aula. A primeira edição do método foi publicada em 1829. No prefácio do livro, ele reconheceu que tinha se baseado nas idéias de Barbier.

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O braile é lido passando-se a ponta dos dedos sobre os sinais de relevo. Normalmente usa-se a mão direita com um ou mais dedos, conforme a habilidade do leitor, enquanto a mão esquerda procura o inicio da outra linha. O braile é subdividido em três graus: o grau 1 é a forma mais simples, em que se escreve letra por letra; o grau 2 é a forma abreviada, empregada para conjunções, preposições e pronomes mais comumente usados, como por exemplo, mas, de, você e por que; abreviaturas ainda mais complexas, como para –ista, -mente e –da- de, formam o grau 3, que exige ótima memória e tato muito desenvolvido.
Essas abreviações são necessárias para reduzir o tamanho dos livros e permitir maior rapidez na leitura. Mesmo assim, os livros são bastante volumosos: o Novo dicionário da língua portuguesa, edição reduzida, de Aurélio Buarque de Holanda, tem 35 tomos. O romance Gabriela, cravo e canela, de Jorge Amado, nove. O braile aplica-se a qualquer língua, sem exceção, e também à estenografia, à música – Braille, por sinal, era ainda exímio pianista – e às notações cientificas em geral. Isso resulta do aproveitamento das 63 combinações em códigos especiais, que multiplicam as suas possibilidades. A escrita é feita mediante o uso da reglete, também idealizada por Braille: trata-se de uma régua especial, de duas linhas, com uma série de janelas de seis furos cada, correspondentes às células braile.

A régua desliza sobre uma prancheta onde está o papel, que é pressionado para formar os pontos em relevo com o punção – uma espécie de estilete. Com a reglete, escreve-se a direita para a esquerda, com os símbolos invertidos – algo mais fácil para os deficientes visuais do que se pode imaginar. A leitura é feita normalmente, da esquerda para a direita, no verso da folha. Além da reglete, o braile pode ser escrito com uma máquina especial, de sete teclas – seis para os pontos e uma párea o espacejamento. A máquina foi inventada pelo americano Frank H. Hall, em 1892. Louis Braille morreu de tuberculose em 1852, com apenas 43 anos. Temia que seu método desaparecesse com ele, mas, finalmente, em 1854 foi oficializada pelo governo francês.

No ano seguinte, foi apresentado ao mundo, na Exposição Internacional de Paris, por ordem do imperador Napoleão III (1808-1873), que programou ainda uma série de concertos de piano com ex-alunos de Braille. O sucesso foi imediato e o sistema se espalhou pelo mundo. Em 1952, o governo francês transferiu os restos mortais de Braille para o Panthéon, em Paris, onde estão sepultados os heróis nacionais.
No Brasil, o método começou a ser adotado em 1856, e as duas únicas instituições que imprimem em braile são a Fundação para o Livro do Cego, de São Paulo, e o Instituto Benjamin Constant, do Rio de Janeiro: juntas editam cerca de 25 títulos por mês, num total de 4 mil volumes – aquém das necessidades. Por lei, são obrigadas a distribuí-los gratuitamente aos 750 mil cegos que se estima existirem no país.

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Para saber mais: SuperMundo

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