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“Falcão e o Soldado Invernal” quer usar a fórmula Marvel para falar sobre os problemas do mundo

Conversamos com Anthony Mackie, Sebastian Stan e os criadores da nova série do Disney+, que estreia na próxima sexta (19). Saiba o que vem por aí.

Por Rafael Battaglia
Atualizado em 14 mar 2021, 20h22 - Publicado em 14 mar 2021, 19h33

Um problema de escala global afeta a vida de bilhões de pessoas e nos força a mudar a maneira como nos relacionamos uns com os outros. Tal ameaça, como tudo na vida, um dia irá passar – mas não antes de deixar profundas cicatrizes na sociedade.

Isso poderia ser a descrição da Covid-19, mas estamos falando de outro problema aqui: o estalar de dedos de Thanos no final de Vingadores: Guerra Infinita (2018), que dizimou metade da vida do Universo.

Em Ultimato (2019), Homem de Ferro, Capitão América e cia. fizeram com que as coisas voltassem ao normal – cinco anos depois. Mas, convenhamos: se metade da população mundial sumisse por todo esse tempo, é bem provável que tudo ficasse às avessas. E não apenas para quem piscou e acordou metade de uma década mais velho, mas também para os que sobraram e, de certa forma, tiveram que seguir em frente.

Esse é exatamente o ponto de partida de Falcão e o Soldado Invernal, a segunda série do Universo Cinematográfico Marvel (o MCU) do Disney+ e que estreia nesta sexta-feira (19). É também a primeira diferença notável em relação à WandaVision: enquanto a série da Feiticeira Escarlate homenageava a televisão e as sitcoms do passado, a principal inspiração para a nova produção da Marvel é o mundo real.

“O estalo de Thanos está diretamente ligado às motivações dos vilões e aos embates da série”, disse à Super Malcolm Spellman, o principal roteirista de Falcão e o Soldado Invernal. “É sobre o planeta inteiro lidando com esse problema – e tentando se unir.”

“Nossa maior inspiração foi, de fato, o noticiário”, conta Kari Skogland, diretora que comanda todos os seis episódios (de uma hora cada) da série. “Quisemos que ela fosse extremamente relevante ao abordar problemas e questões atuais.”

Kari e Malcolm têm uma vasta experiência em TV. A cineasta canadense já dirigiu episódios de programas como Boardwalk Empire, The Walking Dead, The Handmaid`s Tale – pela qual foi indicada a um Emmy em 2018 – e O Justiceiro, uma das séries da Marvel na Netflix. Já Malcolm, que cresceu lendo quadrinhos, escreveu para Empire – Fama e Poder, sobre uma família dona de uma gravadora de hip-hop.

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A dupla se juntou à equipe criativa da série logo no começo do projeto, dois anos atrás – precisamente, após Ultimato. Ou seja: apesar do paralelo traçado com a pandemia, tudo foi planejado bem antes dos primeiros casos de Covid-19 em Wuhan, na China. No entanto, há um outro elemento presente na produção, um problema social extremamente atual e, ao mesmo tempo, antigo: o racismo.

O peso do legado – e do escudo

Sebastian Stan retirando o escudo do Capitão América da árvore.

No final de Ultimato, o Capitão América, já velhinho, entrega o seu escudo para Sam Wilson, seu companheiro de luta desde Capitão América 2: O Soldado Invernal (2014). É uma bela cena de passagem de bastão. “A história irá explorar a jornada de Sam como um homem negro que assume esse posto – e toda a responsabilidade que vem com isso”, explica Spellman.

É uma questão que já pairava sobre os EUA mesmo antes do assassinato de George Floyd por policiais brancos, em maio de 2020. O movimento Black Lives Matter, que luta contra a violência às pessoas negras, começou em 2013. Já o protesto de extrema-direita que rolou na cidade de Charlottesville, com direito a mensagens neo-nazistas de ódio a negros, judeus, imigrantes e gays, aconteceu em 2017.

Parte desse debate deve ser abordado também por um dos novos personagens do MCU: John Walker, o Agente Americano, que será interpretado por Wyatt Russell (filho de Kurt Russell, que também já deu as caras na Marvel em Guardiões da Galáxia 2). Ele é uma espécie de Capitão América politicamente incorreto, e surgiu nos quadrinhos nos anos 1980. Foi a escolha do governo para assumir o mando do Capitão após Steve Rogers. Mas não deu certo: sua visão torta de patriotismo, além dos métodos extremos, logo fizeram com que ele se tornasse antagonista do herói.

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Em uma entrevista para a revista Entertainment Weekly, o ator Anthony Mackie, que vive o Falcão, falou que o maior desafio do personagem será o de preencher o vácuo deixado pelo Capitão – um espaço que, provavelmente, o Agente Americano tentará ocupar. Mas não deixou o humor, marca registrada da Marvel, de lado. “Eu não fazia ideia do peso dessa coisa”, disse, em referência ao escudo herdado. “Um disco de quase 5 quilos pendurado no seu braço não é a coisa mais fácil de lidar.”

Mas ele não precisará cuidar disso sozinho.

Uma dupla do barulho

Anthony Mackie e Sebastian Stan em roupas comuns na série 'Falcão e o Soldado Invernal'.
(Marvel Studios/Reprodução)

A trajetória do Soldado Invernal dentro do MCU é, de longe, uma das mais complexas. Bucky Barnes começou como o braço direito e melhor amigo de Steve Rogers durante a 2ª Guerra Mundial. Dado como morto, ele reapareceu décadas depois como uma arma da H.I.D.R.A. e foi um dos motores da briga entre o Capitão e o Homem de Ferro em Guerra Civil (2016). Depois de muita lavagem cerebral, congelamentos, dois braços metálicos e uma temporada de recuperação em Wakanda, Bucky está pronto para ser o protagonista ao lado de Sam.

“Os traumas do passado sempre vão acompanhá-lo, e acho que é isso que faz com que as pessoas se conectem com ele”, disse Sebastian Stan, o ator que dá vida ao personagem. “Com a série, será possível mergulhar em um nível mais profundo da relação dele com o mundo.” Afinal, assim como Steve, ele é um homem fora do seu tempo, e mesmo com a sua participação nas batalhas contra Thanos, ainda está em busca de redenção.

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Os rumores sobre uma série com Bucky e Sam começaram ainda em 2016, quando a ácida (e divertida) relação entre os dois em Guerra Civil fez com que os fãs imaginassem um programa ao estilo buddy cop – uma dupla policial que, apesar das adversidades, precisa se unir para resolver um problema. Não faltam exemplos, como Máquina MortíferaA Hora do Rush Anjos da Lei. “Esse é um dos meus gêneros favoritos, e com certeza foi o nosso objetivo desde o início fazer algo com essa dinâmica”, falou Spellman, cujos filmes favoritos do tipo são 48 Horas, com Eddie Murphy, e Fuga à Meia-Noite, com Robert De Niro.

“Apesar de toda a ação e o clima de thriller de espionagem internacional, tentamos fazer com que o coração da história fosse essa relação pessoal entre os dois”, disse Kari. Fora das telas, Anthony e Sebastian são grandes amigos – o que volta e meia rende momentos hilários em entrevistas e tapetes vermelhos. Não à toa, os dois falaram que, apesar de serem fãs de filmes buddy cop, eles tentaram não se basear em nenhum específico para, assim, criarem a própria dinâmica. “Na verdade, eu só assisto aos filmes do Anthony Mackie, tem tantos!”, brincou Sebastian. “É o que tem me salvado nessa quarentena.”

Marvel: modo de fazer

Daniel Brühl em cena da série 'Falcão e o Soldado Invernal'.
(Marvel Studios/Reprodução)

Sam e Bucky não são os únicos personagens do microverso de Capitão América a dar as caras novamente. Falcão e o Soldado Invernal também terá o retorno da agente Sharon Carter (Emily VanCamp) e do vilão Barão Zemo (Daniel Brühl), que orquestrou os eventos de Guerra Civil e, aqui, pela primeira vez, estará usando o clássico visual dos quadrinhos com a máscara roxa (imagem acima).

Mas, afinal, como são escolhidos os personagens que aparecerão em um projeto do MCU?

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“Quando você entra em uma produção da Marvel, os executivos te dão uma lista com nomes que eles acreditam ter a ver com o que você quer contar, como um cardápio de restaurante”, explicou Spellman enquanto, ironicamente, devorava um prato apimentado de comida mexicana.

Malcolm conta que o cardápio é constantemente mudado – e você não sabe de nada do que está acontecendo com as outras produções. “Eles apenas dão algumas pistas e sugestões sobre a direção que a história precisa tomar e o momento certo de apresentar determinados personagens. Mesmo dividindo a mesa da lanchonete com o pessoal de WandaVision Loki [a próxima série do Disney+], eu não poderia perguntar nada sobre o enredo deles. Trabalhar no MCU é incrível, mas também uma experiência doida.”

Quando a pandemia interrompeu as gravações da série, em março de 2020, a equipe estava filmando em Praga, na República Tcheca. “Por sorte, nós já havíamos gravado boa parte das cenas, e pudemos adiantar a pós-produção”, relembra Kari. Com um orçamento estimado em US$ 150 milhões, Falcão e o Soldado Invernal, como antecipa o trailer, promete entregar cenas de ação e efeitos especiais dignos dos filmes da Marvel.

“Desde o início, o estúdio pediu que a série fosse construída como seis filmes individuais, interconectados pelo mesmo fio de história”, disse Spellman. Para ele, essa estrutura demandou um grande trabalho da equipe de roteiristas, já que escrever para cinema e para TV são coisas bem diferentes. “Um roteiro para um filme é algo mais verticalizado. Você escreve algo que, em certo ponto, precisa levar a uma conclusão. Já nos scripts para televisão, o que importa é a horizontalizade: você está sempre preparando terreno para o que vem a seguir.”

No fim das contas, Malcolm se diz satisfeito com o trabalho – e pronto para topar qualquer outro projeto da Marvel que surgir pela frente. Kari não fica para trás: “Digamos que um filme é como um aperitivo, e uma série, como Falcão e o Soldado Invernal, é a refeição completa”, disse a diretora, mantendo a tradição das analogias gastronômicas.

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Um primeiro passo

A representatividade de Falcão e o Soldado Invernal vai além da história contada nas telas. “Depois de tantos anos em produções da Marvel, foi a primeira vez que eu fiquei realmente impressionado com a quantidade de pessoas negras e mulheres trabalhando dentro do set”, disse Anthony, que costuma cobrar por esse tipo de representatividade. “Fico feliz que o estúdio ouviu o que tínhamos a dizer. Todos nós só temos a ganhar quando damos oportunidades a essas pessoas.”

O ator cita como exemplo Zoie Nagelhout, uma das produtoras executivas da série e que tem apenas 25 anos. De fato, se olharmos o futuro do MCU, dá para ver que, cada vez mais, mulheres e minorias ganharão espaço dentro e fora das telonas.

“Não apenas a Marvel, mas Hollywood como um todo deve se esforçar nesse sentido”, acrescenta Anthony. “É um processo lento, mas será muito melhor quando o elenco e a equipe dos filmes e séries realmente se parecer com o mundo ao redor deles.”

Por ora, Sebastian e Mackie não foram confirmados em nenhum projeto futuro da Marvel – ainda que possuam contratos vigentes. Mas em um universo sem Steve Rogers nem Tony Stark, é bem provável que eles continuem por aí como heróis veteranos. Quanto aos planos para 2022, os dois esperam fazer uma visita adequada ao Brasil.

Sebastian veio ao País em 2018 para a CCXP, mas praticamente não saiu do hotel. Já Mackie esteve por aqui no mesmo ano, mas para gravar cenas do episódio “Striking Vipers”, de Black Mirror – uma visita igualmente rápida. “Mas eu me lembro de uma coisa”, conta Anthony. “São Paulo tem muita, mas muita gente.” Errado ele não está.

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