Revista em casa por apenas R$ 9,90/mês
Continua após publicidade

Podemos nos dar ao luxo de ser ricos?

Artigo do professor aposentado Peter Holway, em que analisa o crescimento econômico, o crescimento populacional e o alto consumo mundial.

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h53 - Publicado em 30 nov 1992, 22h00

Peter Holway

Você está feliz da vida sentado em sua sala e de repente percebe que começa a cair água do teto. A torneira do banheiro deve ter ficado aberta. Você: a) nem liga, pois o piso da sala não ficou muito molhado; b) começa a enxugar com um paninho; c) fecha a torneira. É mais ou menos assim que estamos tratando as graves questões do meio ambiente. Os recursos naturais diminuem dramaticamente e um desastre mundial parece iminente, mas não somos capazes de fechar a torneira.

Vamos encarar a questão: estamos em crise agora, e não estivemos há 100 anos, porque agora consumimos mais. Por dois motivos: somos mais gente, e somos muito mais ricos. Dentro de sessenta anos a população mundial terá dobrado, e o crescimento econômico, a uma média de 2% ao ano, praticamente quadruplicará nossa renda per capita. Como nossa capacidade de consumo é o produto desses dois fatores, caminhamos para uma capacidade de consumir oito vezes maior, nos próximos sessenta anos. Ainda assim, há quem duvide de que tenhamos razões para nos preocupar e quem pense solucionar o problema reciclando vidro e papel, usando lâmpadas de menor consumo de energia ou restringindo o uso de automóveis. Tais medidas podem diminuir o consumo em 10%, se tanto: como resposta a um aumento de 800%, representa apenas tentar enxugar a água que cai do teto com um paninho.

Para fechar a torneira devemos encarar os dois problemas ao mesmo tempo: o crescimento da população
e o seu enriquecimento global.Estabilizar a população e permitir que o padrão de vida continue subindo não adianta.Duplicar o padrão de vida seria tão prejudicial ao meio ambiente quanto duplicar a população.
Dos dois, o problema mais complicado é o crescimento econômico, pois coexistem no mundo a opulência e a pobreza: é preciso encontrar um meio de deter o crescimento econômico não para todos, mas apenas para os que já possuem riqueza suficiente. Para isso, devemos estimar duas grandezas-chave.
A primeira é o consumo máximo sustentável (e sua conseqüente taxa de desperdício) que a Terra pode suportar. A segunda é o nível de consumo capaz de satisfazer as necessidades básicas de toda a população. Um cálculo razoável permite imaginar 1 bilhão de pessoas no mundo desenvolvido,com nível de vida 15 vezes maior que o dos 4 bilhões que vivem no mundo subdesenvolvido.Para facilitar o raciocínio, vamos chamá-los ricos e pobres.Tomando como unidade o consumo anual de 1 bilhão de pobres, teríamos um consumo mundial de 4 unidades para os pobres e 15 unidades para os ricos.Por esse cálculo, torna-se claro que os pobres consomem muito mais.Assim,a cifra que precisamos encontrar situa-se entre 1e 15 unidades por bilhão de pessoas.

Continua após a publicidade

Os que ganhavam um salário considerado médio para os padrões britânicos nos anos 60 ­­ ­­­­­­­­­­­­­- quando o nível de vida era metade do atual – talvez se lembrem de que tínhamos tudo o que era considerado essencial. Esse caçulo grosseiro situa nosso mínimo entre 1 e 7.Vamos simplificar ainda mais e considerar o mínimo como sendo 4 unidades por bilhão de pessoas.Isso significaria quadruplicar a capacidade de consumo dos pobres, no momento em que o seu número dobraria;seu consumo,portanto,chegaria a 32 unidades (8 bilhões de pessoas com 4 unidades de consumo por bilhão ).Mesmo que os ricos ficassem parados na sua riqueza atual, o consumo total subiria para 47 unidades – 2,5 vezes o valor atual.

Ou seja: para alcançar uma sociedade estável, precisaríamos reduzir, e bastante, o nível de vida dos ricos. Isso exige mudanças, sem dúvida difíceis de conseguir, no nosso modo de pensar, redefinindo termos como “crescimento econômico”, “ desenvolvimento” e “ produção de riqueza”.Nessa sociedade a propriedade dos bens não mais conferiria status e o consumo desenfreado seria considerado crime.Para chegar a ela, alguns propõem uma política de incentivos, como a decretação de pesados impostos ambientais.Nada disso funcionará, pois os problemas decorrem, em boa parte , de nossa insistência em agir tendo em vista apenas nossos interesses materiais imediatos.

Mas não é só. Eles decorrem também de um sistema econômico que parece incapaz de sobreviver à falta de crescimento econômico. Aqui na Grã-Bretanha, por exemplo, o nível de vida vinha crescendo incessantemente desde o final da guerra, em 1945, mas agora estabilizou-se. Ele está tão alto quanto sempre, mas, mas como o capitalismo de mercado não funciona sem crescimento, não expandimos o nível de trabalho e a riqueza, e como conseqüência temos mais de 3 milhões de desempregados, pedintes nas ruas e até uma queda no nível de expectativa de vida.

Continua após a publicidade

Portanto, precisamos de um novo sistema econômico, capaz de sobreviver sem crescimento. Não conseguiremos formar uma sociedade estável se continuarmos a agira baseados no princípio de que todos, ricos e pobres, devem e podem consumir o máximo. A única maneira de sobrevivermos é reduzir o consumo. Ou, voltando a figura inicial, fechar a torneira.

Esse texto foi publicado originalmente na revista inglesa New Scientist.Peter Holway e professor aposentado e mora da ilha de Wight, Inglaterra.


Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Oferta dia dos Pais

Receba a Revista impressa em casa todo mês pelo mesmo valor da assinatura digital. E ainda tenha acesso digital completo aos sites e apps de todas as marcas Abril.

OFERTA
DIA DOS PAIS

Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Super impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 9,90/mês

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 9,90/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$118,80, equivalente a 9,90/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.