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Livro da Semana: “Para Explicar o Mundo”, de Steven Weinberg

O prêmio Nobel de Física investiga como, exatamente, os primeiros cientistas saíram da estaca zero – e chegaram às conclusões contraintuitivas (como a de que a Terra não é plana) que sustentam o saber atual.

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 25 fev 2021, 19h56 - Publicado em 25 fev 2021, 10h18

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No filme O Homem da Terra (2007), John Oldman é um protagonista que, de dez em dez anos, abandona sua vida e a reconstrói do zero em outro lugar. Ele é obrigado a fazê-lo pois, caso contrário, todos de seu convívio perceberiam que ele não envelhece. Como a Mônica ou o Mickey, o sujeito é um homem pré-histórico que congelou em uma idade fixa há 12 mil anos – e viveu toda a história da civilização desde então, sem ganhar uma ruga no rosto. 

Em certa altura do filme, John explica que, uns 500 anos antes de Cristo, decidiu caminhar rumo ao leste. Ele imaginou que naquela direção haveria um lugar mais quente, pois é lá que nasce o Sol. Parece uma conclusão inocente para qualquer estudante de hoje: o aparente “nascimento” da estrela é consequência da rotação da Terra em torno de seu próprio eixo, e sabemos que cada ponto da superfície do planeta é exposto a diferentes quantidades de luz solar conforme a latitude, o horário do dia e a estação do ano. 

Mas como John poderia saber disso? Quem vê a Terra sem um livro na mão não está em uma perspectiva muito privilegiada para entender o que está realmente rolando. A superfície do planeta parece plana, mas na verdade é redonda – nós é que somos pequenos demais para ver a curvatura. O Sol e a Lua às vezes parecem ter o mesmo tamanho, e não há nenhuma evidência óbvia de que um é maior e está bem mais distante que o outro. Para não falar nas estrelas, que parecem vagalumes, mas com frequência são maiores que o próprio Sol.  

É deslumbrante pensar que, na Antiguidade, pessoas com o mesmo conhecimento prévio de John – isto é, nenhum conhecimento – foram capazes de imaginar os fenômenos naturais de outro ângulo, especular que havia algo além do que podemos ver e derrubar o primeiro dominó da longa fileira que levaria à ciência contemporânea. 

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As breves introduções à história da ciência que temos no colégio não fazem juz à cabeça aberta que os pioneiros tiveram para formular mesmo as ideias mais simples. O que levou Demócrito, por exemplo, a especular que tudo era feito de átomos? A pele humana, uma árvore, o mármore de um templo têm texturas, aparências e cheiros muito diferentes. Quem em sã consciência apostaria que são feitos das mesmas partículas fundamentais? Ninguém. Até, claro, que alguém apostou. 

No livro “Para explicar o mundo: a descoberta da ciência moderna”, o físico de partículas Steven Weinberg, prêmio Nobel de Física, faz um retrato realista dos primórdios do saber humano: explica que os gregos eram mais poetas que acadêmicos, que ninguém exigia evidências para comprovar afirmações e que era comum criar critérios arbitrários para classificar as coisas – em vez observá-las com atenção para descobrir o que elas têm ou não em comum. 

Weinberg também explica as permanências. O que os cientistas de hoje ainda fazem igual aos pioneiros? Os gregos eram movidos por um intenso senso estético, que perdurou: físicos e matemáticos falam cotidianamente na beleza e na elegância de equações, e a simplicidade e abrangência de uma hipótese é quase sempre sinal de que ela é superior, em poder explicativo, a suas alternativas mais complexas e específicas.

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Outra coisa que não mudou muito é a enorme lista de coisas que ainda não conhecemos. Beleza: nós podemos até saber a distância até o Sol ou a forma da Terra. Mas essas dúvidas foram substituídas por outras que sequer sabemos como abordar: o que é a matéria escura? E a energia escura? Há mesmo uma singularidade no interior do buraco negro? Nosso horizonte de investigação nunca foi tão amplo. Mas sempre haverá novas perguntas para suplantar as antigas.

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