Lucia Neco estuda o comportamento social em aranhas
A #MulherCientista desta semana descobriu que aracnídeos fazem amizade e são bons de cooperação. E agora estuda se é possível expandir a definição de comportamento social para incluir plantas e até bactérias.
Se você se lembra da viúva-negra arrancando a cabeça de um macho sempre que pensa em aranhas, não faz ideia do quanto esses aracnídeos podem ser amigáveis. Existem espécies cujos indivíduos colaboram nas caçadas e até constroem teias juntos. Alguns desses bichos de oito patas elegem melhores amigas, com quem preferem passar o tempo.
Existem mais de 50 espécies de aranhas consideradas sociais. Entender o comportamento desses animais é a paixão de Lucia Neco. Ela começou estudando moscas-das-frutas (as famosas Drosophila) em sua graduação em biologia na UFBA, mas já no segundo ano do curso resolveu mudar da presa para o predador.
No mestrado, ela comparou o comportamento de aranhas com o de insetos que possuem uma estrutura social bem definida, como as abelhas e formigas.
Para isso, Lucia analisou a Anelosimus eximius – uma das espécies mais sociais de aranhas – em situações do cotidiano, como a captura de presas ou durante o rompimento de uma teia. A pesquisadora marcou as aranhas com cores diferentes e observou a interação entre elas. Foi assim que ela constatou a formação de “panelinhas” de aranhas que preferem fazer as atividades em conjunto.
De maneira geral, as aranhas sociais não possuem hierarquia e divisão de tarefas tão bem definidas quanto às dos insetos, mas elas sabem cooperar para atingir um objetivo em comum. Além de caçarem e consertarem a teia juntas, elas também cuidam dos ovos umas das outras.
Lucia também já realizou pesquisas com mamíferos. Ela investigou a automedicação entre esses animais. Quando estão doentes, alguns deles procuram plantas, solos ou até outros animais que tenham substâncias com algum efeito terapêutico. Há relatos de macacos passando frutas cítricas no corpo para afastar insetos – o mesmo princípio da citronela que compramos como repelente.
A pesquisadora coletou e revisou estudos que descreviam a automedicação em várias espécies. A abrangência desse comportamento em diferentes mamíferos leva a concluir que o comportamento evoluiu por seleção natural mais de uma vez. Os biólogos chamam isso de evolução convergente.
Mas vamos voltar às aranhas. Será que só os animais podem ser considerados seres sociais? Afinal, o que é um comportamento social? São esses temas que Lucia está estudando atualmente na Universidade do Oeste da Austrália. Ela faz doutorado em filosofia da ciência, e explora o que um indivíduo ou comunidade de seres vivos precisam ter para serem considerados sociais.
Geralmente, os livros e estudos abordam a socialidade apenas em animais. A pesquisadora propõe que o mínimo necessário para essa classificação é que o ser em questão tenha algum grau de autonomia e cognição (que pode ser definida, grosso modo, como a capacidade de perceber o ambiente ao redor e obter informações sobre ele). Isso abre espaço para que plantas e microorganismos também sejam considerados sociais.
Afinal, bactérias podem interagir entre si para alcançar um objetivo em comum, enquanto as plantas têm capacidade de responder a mudanças no ambiente externo e interagir umas com as outras. No futuro, Lucia pretende voltar ao Brasil e converter esse conhecimento em pesquisas no país.