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Quem é o segundo paciente curado de infecção por HIV

Após um transplante de medula óssea, Adam Castillejo, o "Paciente de Londres", não carrega mais o vírus. Foi o que provou um novo estudo.

Por Bruno Carbinatto
Atualizado em 10 mar 2020, 19h12 - Publicado em 10 mar 2020, 18h48

Um ano após o anúncio de sua cura, o homem até então conhecido como “paciente de Londres” –  segundo humano a ter sua infecção por HIV curada na história – decidiu tornar pública sua identidade. Adam Castillejo, de 40 anos, se tornou livre do vírus após receber um transplante de medula óssea. O anúncio veio junto a novos dados que revelam que, de fato, a infecção parece ter sumido definitivamente. “Quero ser um embaixador da esperança”, disse ao The New York Times sobre a decisão de contar sua história.

Castillejo ganhou a alcunha de “Paciente de Londres” por conta do local onde recebeu o tratamento. Ele foi curado da doença após receber uma doação de medula óssea de um homem que possuía uma mutação genética que o tornava resistente ao vírus. Até então, somente um caso de cura de HIV era conhecido: o do americano Timothy Ray Brown, chamado na época de “Paciente de Berlim”, que também passou um procedimento semelhante, recebendo células-tronco de um doador com a mesma mutação.

Os médicos responsáveis pelo caso, porém, lembraram que, apesar de um enorme avanço para a área, a cura só foi possível por conta de uma combinação de fatores específicos e não representa uma fórmula pronta para acabar com a doença em outros pacientes. Tanto que, em 2019, quando o caso de Castillejo foi anunciado ao público, a equipe evitou utilizar o termo “cura” e preferiu a expressão “remissão”, porque não estava claro se a doença havia sumido de vez. Mas um novo estudo, publicado na revista The Lancet HIV, mostrou que, após 30 meses sem utilizar nenhum tratamento antiviral, as células do paciente continuam livres do vírus – o que dá para chamar de cura definitiva.

Quem é o “Paciente de Londres”

Adam Castillejo nasceu em Caracas, Venezuela, e se mudou com sua mãe para Londres, Inglaterra, em 2002. No ano seguinte, ele foi diagnosticado com o vírus HIV, que infecta células do sistema imunológico e pode levar à Aids. Na época, os tratamentos disponíveis eram menos eficientes que os de hoje, mas Castillejo permaneceu firme e conseguiu manter uma vida estável.

Em 2011, um segundo diagnóstico piorou sua condição: os médicos descobriram que Castillejo tinha um linfoma (um tipo de câncer) em estágio avançado. Teve início, assim, uma longa batalha contra o câncer, com a dificuldade extra de conciliar a quimioterapia com medicamentos para combater o HIV. E, por anos, o tratamento não surtiu efeito, apesar dos severos efeitos colaterais.

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Quatro anos depois, em 2015, quase todas as opções de tratamento haviam se esgotado, e a situação mental e física de Castillejo piorou. Ao The New York Times, ele contou que chegou a considerar buscar o serviço de suicídio assistido na Suíça, onde a prática é legal. Mas ainda havia uma esperança: um transplante de medula óssea. Apesar da nacionalidade latina de Castillejo, a equipe de médicos conseguiu uma série de doadores compatíveis na Europa, já que seu pai era descendente de holandeses. Mas um doador em específico, um homem alemão, era especial. Isso porque, talvez, sua medula conseguiria não só curar o câncer de Castillejo – ela poderia também combater a infecção por HIV.

Como a cura funciona

Quando o vírus HIV entra no corpo, ele consegue infectar células do sistema imune humano e usá-las para se replicar. Se a doença não for tratada, pode chegar ao estágio da Aids, quando o sistema imunológico do paciente fica comprometido e vulnerável a outras infecções secundárias. 

Não há cura conhecida para o HIV, apenas tratamentos de uso contínuo que retardam a progressão da doença. Mas algumas pessoas são mais resistentes do que outras. Isso porque, para o vírus entrar nas células, ele precisa se conectar a uma proteína específica do nosso corpo – a CCR5. E algumas pessoas nascem com uma mutação no gene que carrega a receita dessa proteína. Esses indivíduos fabricam CCR5 mutantes, que o vírus não consegue se conectar direito e, portanto, têm mais dificuldade em parasitar as células. Por isso, pessoas com CCR5 mutantes são resistes à infecção. 

A mutação delta 32, responsável pelo fenômeno, é mais presente em populações europeias caucasianas – estimativas dizem que 10% dessas pessoas possuem tal resistência. E o doador de medula óssea de Castillejo, por sorte, fazia parte desse grupo. Como a medula óssea é responsável por produzir os leucócitos – as células-alvo do HIV – a operação poderia tornar o “Paciente de Londres” também resistente, pelo menos na teoria.

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Em 2016, o transplante finalmente ocorreu, e conseguiu curar o linfoma. Mas os médicos não estavam certos se a infecção de HIV seria eliminada, então Castillejo continuou com o tratamento antiviral até outubro de 2017, quando finalmente decidiu descontinuar. E, surpreendentemente, os exames revelaram que, mais de um ano depois, os níveis do vírus estavam indetectáveis em seu sangue, levando a equipe a anunciar sua remissão ao público.

Agora, uma nova análise dos dados só encontrou resquícios do material genético viral no corpo de Castillejo. Esses resquícios são chamados por cientistas de “fósseis”, porque só indicam uma infecção passada, mas não são capazes de reiniciar a doença. E, com isso, o paciente foi finalmente considerado “curado”.

Apesar de ser um grande avanço e apenas o segundo caso do tipo na história, o tratamento de Castillejo não é uma cura universal para o HIV. Isso porque o transplante de medula óssea é um procedimento agressivo e arriscado, só indicado quando realmente é a única opção – como em casos de câncer, por exemplo. E mesmo ele não pode ser eficaz: exceto no caso de Timothy Ray Brown, outras tentativas parecidas não foram muito eficientes. Ao mesmo tempo, os tratamentos existentes atualmente permitem que pacientes com HIV vivam vidas longas e saudáveis, desde que contínuos, e por isso são preferíveis.

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