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Por que alguns cachorros comem cocô?

A resposta pode estar nos antepassados deles: os lobos. Entenda por que esse hábito meio nojento também pode ter um lado positivo

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
22 fev 2018, 15h36

Alguns cachorros têm uma dificuldade crônica em dizer adeus ao próprio cocô. Eles preferem comê-lo. Isso quando um dejeto fresco de outro peludo não dá as caras na calçada, apetitoso, durante um passeio. Aí é irresistível. Esse comportamento – que, felizmente, acontece com frequência em apenas 16% dos cães – não deixa só os donos preocupados: os biólogos também acham difícil explicá-lo.

Afinal, fezes transmitem doenças. Do ponto de vista evolutivo, um animal que gosta de comer o que não deve tende a morrer mais rápido e a deixar menos descendentes – o que diminuiria o número de genes “comedores do cocô” circulando na população ao longo do tempo, até o comportamento desaparecer de vez.

É o mesmo mecanismo que deu ao ser humano a sensação de nojo. Nós temos aflição de alimentos em decomposição porque os Homo sapiens mais antigos, que não tinham essa sensação, morreram tentando comê-los – e não passaram o comportamento nocivo para frente. A seleção natural não perde tempo com más ideias.

Algumas situações, em princípio, teriam força suficiente para contrariar essa pressão evolutiva óbvia. Talvez os cachorros que comem cocô usem o truque para regular a microbiota intestinal, quando necessário (ou seja, ingerir bactérias que melhorem o funcionamento do intestino). Talvez eles façam isso só quando estão passando fome. Ou talvez eles tenham problemas psicológicos.  

Mas não é o que mostra um artigo científico publicado hoje por veterinários da Universidade da Califórnia – o maior e mais completo relatório já produzido sobre o assunto, com informações sobre mais de 3 mil animais.

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Os pesquisadores perceberam que os cachorros que não comem cocô (a maioria, 77%), não comem de jeito nenhum. Em hipótese alguma. Os que comem, por outro lado, dificilmente abandonam o hábito, mesmo depois de receberem tratamento profissional, com remédio e adestrador. Sexo, idade, castração, dieta e a idade em que o cachorro foi separado da mãe na infância não tiveram influência sobre as estatísticas.

A frequência com que um cachorro é exposto a cocô, por outro lado, influi. Cachorros que moram com outros cachorros têm mais tendência a fazer escolhas alimentares duvidosas – justamente porque há mais dejetos dando sopa. A raça também tem alguma influência: o pastor-de-shetland é o que mais gosta do prato. O poodle, por outro lado, é o que tem mais nojinho.

A maioria dos cachorros que comem cocô só o ingerem ele for fresco, ou seja, tiver sido produzido há no máximo dois dias. E é aí que entra, segundo os pesquisadores, a explicação mais plausível: lobos, em estado selvagem, cultivam o hábito de botar fezes para dentro justamente para evitar que elas fiquem jogadas no ambiente, atraindo moscas, vermes e outras criaturinhas pouco higiênicas. É provável que os riscos de saúde associados a comer o cocô fresco, bem rápido, sejam menores que os de deixá-lo ao relento.

Mais uma peça pregada por Darwin. Na dúvida, tenha um poodle. E o mantenha longe dos dejetos alheios.

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