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O par perfeito

Entenda como as forças da natureza agem na hora de você escolher o parceiro ideal. E saiba o que isso tem a ver com drogas pesadas

Por Nina Weingrill
Atualizado em 31 out 2016, 18h48 - Publicado em 31 out 2008, 22h00

Não podia ser mais claro: só aquela pessoa entre as 6 bilhões do planeta pode fazer você sentir o que está sentindo. E é muita coisa. Você está mais feliz do que uma criança numa piscina de algodão-doce, as preocupações sumiram… Na verdade, o resto do mundo evaporou. Ela é tudo o que importa. Se ela está longe, você sente dor. Dor para valer, como se tivesse apanhado. Mas, se ela chega perto, vira o melhor analgésico do mundo. Parabéns: você está apaixonado. Caiu na maior peça que a natureza já pregou.

“O amor é um mistério.” Coloque essa frase no Google, em qualquer língua, que vão chover músicas, livros, blogs e o que mais for com esse título. Afinal, seria pretensão demais alguém dizer que entende o amor romântico. Mas não para a ciência. Do ponto de vista de quem estuda o assunto, há um consenso: a paixão é o jeito que o seu corpo encontrou de avisar outra pessoa que uma força maior, totalmente incontrolável, fará com que você esteja sempre por perto.

Pense bem. No fundo, os relacionamentos não passam de um mercado: a tendência é escolher a pessoa mais bonita, inteligente, charmosa e bem resolvida entre aquelas que toparem ficar com você. É como o mercado de aluguéis. O proprietário sempre quer o melhor inquilino do mundo, mas tem de se contentar com o melhor que aparecer. O inquilino quer o apartamento mais incrível, mas tem de ficar feliz com o menos ruim que encontrar.

Nisso, temos uma relação instável: a qualquer momento o inquilino pode se mudar para um apartamento melhor e deixar o proprietário na mão. O dono do imóvel também pode dar uma bundada no inquilino se encontrar alguém mais interessante, como um parente, para morar em seu apartamento.

É para evitar esse tipo de problema que existem contratos para reger os aluguéis: quem passar o outro para trás tem que pagar uma multa. Isso desencoraja tanto um quanto outro de romper o acordo. E as duas partes ficam mais tranqüilas enquanto o contrato está de pé.

O amor funciona mais ou menos assim. Com a diferença que a natureza não escreve leis no papel, mas no seu corpo. Como saber que um parceiro não vai trocar você, leitora, pelo primeiro rabo-de-saia com mais balanço que o seu? E você, leitor? Quem garante que ela não vai fugir com o professor da academia na semana que vem? Ambas as escolhas podem ser tão racionais quanto mudar para um apartamento melhor. Então qual é a saída? Juntar-se com alguém que não está com você por um motivo racional, mas justamente pelo oposto disso: uma emoção. “Uma emoção que a pessoa não decidiu sentir e, portanto, não pode decidir não sentir. Uma emoção que não será imediatamente transferida para outro. Uma emoção que garantidamente não é simulada, porque tem custos fisiológicos como taquicardia, insônia e anorexia. Uma emoção como o amor romântico”, diz o psicólogo Steven Pinker, da Universidade Harvard, em seu livro Como a Mente Funciona.

O amor, então, funciona como um contrato de rescisão com multa altíssima. Alguém completamente apaixonado por você não vai sumir de uma hora para outra, não vai “trocar de apartamento” e deixá-lo na mão (até vai, se for o caso, claro, mas não com a mesma facilidade de alguém que não ama você). Ok. Mas aí chegamos a outro ponto: o que faz esse “contrato de rescisão” surgir assim, do nada?

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O ponto é que ele não aparece exatamente do nada. Seu cérebro fica esperto com certos sinais. Sinais que indicam que ali está um bom pai, ou uma boa mãe, para os seus filhos. E um deles está na cara, literalmente. É a…

 

Beleza

Do mesmo jeito que a natureza não escreve leis de rescisão de contrato, ela não nos equipa com estetoscópios e máquinas de tomografia computadorizada. Mesmo assim, surgiram sinais eficientes para os outros detectarem a saúde de um parceiro potencial, e, em última instância, sua capacidade de gerar muitos e bons filhos. Chamamos o conjunto desses sinais de “beleza”.

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Claro que cada tempo e cada lugar tem seus padrões de beleza. Aquelas modelos com maquiagem dos anos 80 parecem palhaças hoje. E a depilação vaginal no estilo brazilian seria uma aberração há 20 anos. Mas moda é uma coisa e sinais de saúde e fertilidade são outra. Esses são universais no tempo e no espaço.

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Simetria, por exemplo. Ter um lado do corpo o mais parecido possível com o outro mostra que o seu organismo está ok – mutações genéticas desagradáveis, como nascer com uma perna muito menor que a outra, quebram nossa simetria natural. Diante disso, nossa percepção extrapolou a parte prática e nos muniu com um software que diz “quanto mais simétrico, melhor”. E são essas pessoas que qualquer um vai achar mais bonitas. Tanto que, para ficar feio, basta simular uma assimetria, como pintar um dente de preto na festa junina ou fazer uma careta. Até bebês de 3 meses passam mais tempo olhando rostos bonitos, os perfeitamente simétricos. E têm medo de careta.

“As mulheres, inclusive, atingem mais orgasmos com homens simétricos”, diz a antropóloga Helen Fisher, da Universidade Rutgers, nos EUA. Faz sentido: a contração orgástica faz a mulher absorver mais esperma – suas chances de engravidar do bonitão aumentam.

E elas também ficam mais atraentes justamente quando estão mais férteis: as mãos, orelhas e seios (quem liga para mãos e orelhas?) ficam mais simétricos durante a ovulação.

Existem mais proporções que todo mundo acha naturalmente mais bonitas. Homens com o tronco em forma de triângulo, com ombros largos e sem gordura na cintura ou na barriga, são mais resistentes a vírus e bactérias. Eles podem dar filhos mais saudáveis, então seu corpo já parece mais saudável que os outros do mercado de corpos. Isso também vale para o maior indicador de fertilidade nas mulheres: a relação entre o tamanho da cintura e o dos quadris. Nos homens, nas crianças e nas mulheres que já passaram pela menopausa, a circunferência da cintura mede entre 80 e 95% da dos quadris. Nas mulheres em idade fértil ela fica entre 67 e 80%. Logo que ficam férteis, elas criam um depósito de gordura que serve como reserva de calorias para um eventual bebê.

O instinto dos homens sabe disso, então eles ficam excitados só de ver uma proporção assim. E aí vale aquela regra da simetria: a cabeça extrapola isso e entende que “quanto mais fina a cintura e maior o quadril, melhor”. Pesquisas mostram que os homens gostam mais das que têm uma proporção de 70% ou menos. Faz sentido: os 90-60-90 (90 cm de busto, 60 cm de cintura e 90 cm de quadril) que os concursos de misses consideram como ideal de beleza representam 66%. A Mulher Melancia, capa da Playboy mais vendida no ano, tem 64% (75 x 119 cm). A garota, aliás, não teria problemas para arranjar namorado em nenhuma época. O psicólogo Devendra Singh, da Universidade do Texas, mediu 286 esculturas antigas de mulheres, vindas da Ásia, da África e da Europa, e viu que a proporção entre cintura e quadril nas obras ficava nessa faixa.

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Um belo quadril, por sinal, não significa só mais filhos. Uma pesquisa da Universidade de Pittsburgh mostrou que as crianças que tinham mães com a relação cintura-quadril na faixa de 70% apresentavam um QI maior, em média, que as outras. A tese é que as calorias armazenadas ali ajudaram no desenvolvimento do cérebro dos fetos.

Mesmo com essas vantagens todas, todo mundo sabe que um rosto e um corpo bonitos não são tão importantes quando o assunto é amor romântico. O apelo sexual das pessoas com esses sinais externos de saúde e fertilidade é absurdo. Só que ninguém se apaixona por uma bunda, por um par de ombros Michael-Phelpianos ou pelo rosto da Ana Hickman (tudo bem, aí até dá…). O ponto é que a beleza conta, sim. Mas, Vinícius de Moraes que nos perdoe, ela não é fundamental. Existe uma coisa bem mais importante: o sistema imunológico do outro.

 

Coisa de pele

A reprodução sexuada só existe por um motivo. E não é “dar prazer”. O prazer é só a droga com que o corpo nos recompensa pelo trabalho de combinar nossos genes com os de outra pessoa, já que isso pode gerar um filho.

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E tem de recompensar mesmo: ter um filho é como fazer uma retífica de motor nos genes. Por exemplo: se você se reproduzisse por brotamento, como certas formas de vida, e tivesse nascido com um sistema imunológico que não soubesse se defender de algum tipo de vírus mortal, o risco de seu filho nascer com o mesmíssimo problema seria de 100%. Mau negócio.

Mas você é sexuado. Então basta juntar os seus genes com os de alguém imune ao vírus. Aí seus filhos têm mais chance de nascer com o patrimônio genético recauchutado.

Constituir família com uma pessoa assim, que tenha um sistema imunológico complementar ao seu, significa garantir uma prole com mais chances de sobrevivência. Ótimo negócio. Mas e aí? Como saber quem tem esses genes preciosos?

Parece inusitado, mas você tem um equipamento capaz de fazer isso: seu nariz. Uma experiência que já virou clássica, criada pelo biólogo suíço Claus Wedekind em 1995, mostra isso. Funciona assim: primeiro, os cientistas fazem testes em vários homens e mulheres para medir seus sistemas imunológicos. Depois, pedem que eles usem a mesma camiseta por alguns dias e devolvam ao laboratório. Então as mulheres cheiram as dos homens, e vice-versa. E cada um monta um ranking com os cheiros que consideram mais sexy. Resultado: preferimos o odor de quem tem um sistema imunológico diferente do nosso. Quanto maior a diferença, mais gostosa a sensação de cheirar a camiseta. Se uma peça de roupa de alguém com um sistema imunológico complementar ao seu já dá prazer, imagine a pessoa inteira… Isso ajuda a explicar a “coisa de pele” alegada pelos casais apaixonados. Do ponto de vista do sistema imunológico, eles realmente são duas metades, um é a tampa da panela do outro. E que se dane que ele não seja o Cauã Reymond nem ela a Grazi Massafera. O amor pode até ser cego de vez em quando, só que tem olfato.

Mas o segredo do amor não está só na diferença. As semelhanças são fundamentais e também contam pontos no sucesso de um relacionamento. Há um pouco de Narciso aí dentro de você: na hora de se juntar para valer com alguém, pode achar feio o que não é espelho.

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Almas gêmeas

Imagine o seu próprio rosto transformado em um do sexo oposto. É possível que você considere essa pessoa virtual como o melhor par romântico possível. É o que concluiu o psicólogo David Perret, da Universidade Saint Andrews, na Escócia, depois de pesquisar as reações de seus estudantes aos próprios rostos metamorfoseados. A maioria escolheu a si mesmo, sem saber, como o parceiro ideal.

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Isso parece contradizer a história dos sistemas imunológicos diferentes. Mas, na verdade, uma coisa não invalida a outra: realmente existem casais que se parecem com irmãos, mas isso não significa que essas mesmas pessoas se sintam atraídas por seus irmãos do sexo oposto – cujas defesas do organismo são quase idênticas.

Mas é fato que as pessoas parecidas com você inspiram mais confiança, dizem os pesquisadores. Por quê? Segundo Perret, talvez porque elas lembrem o rosto dos seus pais, as primeiras pessoas em quem você confiou na vida.

Quando o assunto é atração sexual pura e simples, a vantagem é do tipos mais diferentes: um homem baixo pode ter a fantasia de transar com uma mulher muito alta ou uma princesinha de ir para a cama com um ogro. Mas, na hora de escolher para o longo prazo, é básico que haja identificação, seja na aparência, seja na mente.

“Todos nós carregamos uma marca psicológica que leva minúcias sobre experiências da nossa vida e as cicatrizes que essas experiências deixam em nós. Ao conhecer alguém que fisicamente possa nos interessar, procuramos escanear essas marcas nela”, diz o psicólogo Arthur Aron, da Universidade Stony Brook, nos EUA.

A idéia aqui é a seguinte: as pessoas que mais atraem você são aquelas que têm “cicatrizes” parecidas com as suas. Mas com algo a ensinar. “O parceiro ideal, nesse caso, é aquele que sofreu com problemas parecidos com os seus, mas encontrou maneiras diferentes de resolvê-los”, Aron afirma. Por esse ponto de vista, um homem que teve uma infância problemática vai preferir uma moça sensacional que passou pela mesma experiência do que outra tão interessante quanto, mas que não viveu nada disso.

Mas você sabe que não precisa saber a biografia toda de alguém para se apaixonar. Segundo pesquisas que Aron fez com pessoas que não se conheciam, meia hora de conversa é o suficiente para saber se existe alguma conexão. Se houver mesmo, algum tempo depois uma avalanche química vai invadir o cérebro. E você vai saber que se apaixonou.

O processo, lá dentro, começa com descargas de dopamina – a mesma substância que a cocaína e a heroína ativam no cérebro. É ela que faz você se sentir violentamente feliz quando o ser amado está por perto. É ela que dá a sensação de que o mundo todo está soltando fogos enquanto vocês se beijam. Por outro lado, os efeitos colaterais são insônia, taquicardia e falta de apetite. Sem falar na sensação de dependência química – as dores físicas que os apaixonados sentem têm um paralelo nas crises de abstinência dos viciados em drogas.

Essa montanha-russa é demais para qualquer organismo. Por isso mesmo a paixão tem data para expirar: até 3 anos. E o que a faz evaporar é justamente um relacionamento saudável. Isso mesmo: quem destrói os hormônios da paixão são substâncias que o corpo libera durante os orgasmos (veja na página 100). Se a relação continuar bem, elas vão fazer você se sentir cada vez melhor com o seu par, fortalecendo os laços entre os dois. E serão o gatilho para o instinto de virar mãe e pai – as mulheres, por exemplo, têm esses mesmos hormônios ativados durante a amamentação. Aí todos vão viver felizes para sempre… A não ser que um dos dois pule fora para recomeçar esse jogo todo com outra pessoa. Afinal, paixão vicia. E nem todo mundo usa com moderação.

 

Amor químico

O jogo do relacionamento tem 3 estágios. Cada um dirigido por hormônios diferentes. Veja como

 

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1. Atração

Quem manda aqui é a testosterona, presente nos homens e nas mullheres, mas em quantidade bem maior nos machos. Ela dá o impulso para você chegar em alguém interessante.

 

2. Paixão

Se você ficar encantado(a), entra em ação a dopamina, que causa euforia e faz com que você concentre toda a atenção possível no seu amor. Efeitos colaterais: insônia, perda de apetite e taquicardia.

 

3. Comprometimento

Com o tempo a paixão violenta baixa, e quem toma terreno é a ocitocina (nas mulheres) e a vasopresina (nos homens). Eles transformam o turbilhão de êxtase do começo num mar calmo de satisfação.

 

Epílogo

Encontrar o “par perfeito” é uma tarefa sujeita às leis da natureza. Depois cada casal constrói a sua história, certo? Mais ou menos. Veja as classificações que psicólogos criaram para descrever os tipos de relacionamento mais comuns:

 

Pai e filho

Um dos parceiros se comporta como o filho. Ele acredita que, se continuar assim, inseguro e dependente, o parceiro vai cuidar dele. O que assume o papel de pai se esquece das próprias necessidades.

 

Mestre e escravo

Um dos parceiros fica inseguro se algum dia sentir que pode ficar subordinado ao outro, então acaba assumindo a posição de comando, enquanto o outro, que teme a responsabilidade, deixa-se ser controlado.

 

Caça e caçador

Aqui, o acordo (inconsciente) é que um fique buscando intimidade e o outro fuja dela o tempo todo. Às vezes a presa vira caçador, e o jogo continua.

 

Ídolo e fã

Um consente em colocar o outro em um pedestal porque não quer competir e evita se comparar com o parceiro, atitudes que poderiam gerar conflito. Para que isso não aconteça, os dois concordam inconscientemente com sua posição.

 

Cão e gato

Na superfície, mal parece um casal. Brigam o tempo todo por qualquer motivo e evitam a intimidade criando um campo de guerra. Mas eles gostam. Não das brigas, mas das recompensas que surgem nas tréguas.

 

Para saber mais

Por Que Amamos: A Natureza e a Química do Amor Romântico

Helen Fisher, Editora Record.

 

Science of Love: The Wisdom of Well-Being

Thomas Jay Oord, Templeton Foundation Press.

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