O caçador de dinossauros do gelo
O paleontólogo canadense pesquisa dinossauros incomuns, que viveram longe das áreas mais quentes do planeta e sofreram adaptações diferentes.
Roberta Faria
Direto da Antártida
Ele descobriu seu destino em uma caixa de Sucrilhos. Aos 6 anos de idade, Philip Currie encontrou um dinossauro de plástico no meio do café-da-manhã. Desde então, dedica-se a procurar fósseis em lugares tão improváveis quanto o Ártico e o deserto de Gobi, na Mongólia. O paleontólogo canadense pesquisa dinossauros incomuns, que viveram longe das áreas mais quentes do planeta e sofreram adaptações diferentes. Apesar de os alvos da missão já estarem mortos e enterrados há milhões de anos, nem por isso o trabalho é menos perigoso. Philip escala 4 mil metros de gelo em plena Antártida para desencavar – sem luvas e à temperatura de 30 °C negativos – esqueletos de carnívoros mais compridos que um poste.
Philip Currie – Paleontólogo
Dinossauros são associados a lugares quentes. Como você foi parar na Antártida?
Uma pesquisa com fósseis do Canadá apontou que ali viveram grandes bandos de dinossauros. Eles não podiam ficar muito tempo em um lugar, porque a comida acabava. Precisavam migrar. Mas a variação da fauna ao longo das latitudes sugeria que os dinos encontraram uma barreira nos trópicos. Suspeitei que não gostavam tanto de calor quanto se pensa. Logo, os pólos guardariam segredos sobre os dinossauros achados no resto do planeta e poderiam explicar diferenças entre esses animais em cada hemisfério. O trabalho começou no Ártico, durante a década de 1990. O passo seguinte foi olhar para a Antártida.
Como era a vida no Pólo Sul no tempo dos dinossauros?
Na maior parte da história da Terra, a Antártida não esteve coberta por gelo. Como hoje, havia 6 meses de dia e 6 meses de noite, mas era mais quente. Havia muitas plantas, que no inverno perdiam as folhas e tornavam-se dormentes – o que motiva nossa suspeita de que os dinos dali hibernavam ou migravam nessa época do ano. Até agora, encontramos 3 tipos de dinossauros carnívoros, de médio e grande porte, que parecem ser típicos da Antártida, e evidências de outros menores, que viveram entre o Cretáceo e o começo do Jurássico.
Como encontrar dinossauros no gelo?
Trabalhar em regiões altas é bem problemático. Nosso sítio no monte Kirkpatrick, na Antártida, fica a 600 quilômetros do Pólo Sul e 4 mil metros acima do mar. Métodos tradicionais de coleta de fósseis, como utilizar gesso para criar uma forma ao redor do espécime, são impossíveis de usar, porque é simplesmente muito frio para funcionarem – a temperatura oscila entre -10 °C e -30 °C. Usamos dinamite para extrair parte das pedras que estão sobre o dinossauro e depois quebramos as rochas, com os ossos dentro, em grandes pedaços. Em casa, montamos o quebra-cabeça.
Qual a parte mais difícil das escavações polares?
Começar o trabalho e manter as picaretas e serrotes funcionando é difícil, as rochas são muito duras. Por causa do mau tempo, ficamos em média 5 dias presos nas barracas para cada dia de trabalho. O acesso também é complicado. Os pilotos de helicóptero ficam nervosos – é perigoso voar nessas altitudes e temperaturas: o ar é rarefeito e os ventos são fortes.
Parece arriscado também…
Na Antártida, o risco de cair em uma cratera ou ser soterrado por avalanche é enorme. E uma operação de resgate é impossível. O vento surge de repente no platô, assoprando a neve horizontalmente e tornando impossível enxergar ao redor. Você vive no limite e precisa estar preparado para tudo. Temos sempre equipamento de sobrevivência para dois dias, em caso de não conseguirmos voltar. De manhã, levo meia hora só para me vestir. Não gosto de trabalhar com luvas pesadas, por isso fico sem elas o tempo que agüentar para segurar a talhadeira – não mais que 20 minutos.