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Mergulho: Em busca do navio perdido

Mergulhadores são atraídos pelo clima demistério e pela vida marinha nos destroços de navios naufragados. Só na costa brasileira afundaram 1850 embarcações - apenas 350 foram encontradas

Por Da Redação Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 31 out 2016, 18h12 - Publicado em 31 out 2003, 22h00

Marlene Jaggi

Já pensou em ver de perto a nau portuguesa Sacramento, que repousa há 335 anos na Baía de Todos os Santos, em Salvador? Ou o que restou do espanhol Príncipe de Astúrias, o “Titanic brasileiro”, que encerrou seus dias de glória como transatlântico nos rochedos de Ilhabela (SP), em 1916, levando para o fundo do mar a vida de 470 pessoas? Se você anda à procura de emoções, está na hora de mergulhar nesse fantástico mundo nos naufrágios. Segundo o Sistema de Informações de Naufrágios (Sinau), um banco de dados criado pelo biólogo e pesquisador carioca Maurício Carvalho, a costa brasileira abriga 1850 embarcações que naufragaram em diferentes épocas pelos mais variados motivos, entre transatlânticos, cargueiros, graneleiros, navios a vapor, submarinos e paquetes.

Desse total, apenas 350 foram identificados. Os demais permanecem envoltos em mistério. É o caso do Santa Rosa, que desapareceu em 1726, no Nordeste brasileiro, com um tesouro avaliado em 400 milhões de dólares em ouro e prata. Ou então o Rainha dos Anjos, outra nau desaparecida na Baía de Guanabara, em 1722, quando levava presentes do imperador chinês para o papa. Nem a embarcação nem o tesouro, avaliado em mais de 500 milhões de dólares, foram encontrados até agora.

Além dessas, centenas de outras histórias de naufrágios continuam no fundo do mar, à espera de investimentos mais expressivos em exploração ou das pessoas que integram os vários grupos amadores de pesquisas subaquáticas.

As descobertas feitas até agora, entretanto, têm levado conhecimento e adrenalina de sobra a um número cada vez maior de mergulhadores. Pudera! Já imaginou o que é observar de perto os destroços de um legítimo encouraçado como o Aquidabã, usado em batalhas que fizeram parte da história do Brasil, ou de um liberty ship, um navio produzido em série pelos EUA só para a guerra? E os submarinos alemães? Vários foram afundados na costa brasileira. E não são apenas histórias da guerra. Há também relatos de amor e ódio, como os que procuram explicar o choque, em 1887, entre os navios Pirapama e Bahia. Para muitos, não há dúvida: foi o comandante do Pirapama quem jogou, propositadamente, seu navio contra o Bahia, cujo comandante era seu ferrenho rival na disputa pelo amor de uma bela mulher. O Bahia afundou logo após o choque, causando a morte de mais de uma centena de pessoas. O Pirapama ficou bastante danificado, mas só foi afundado dois anos depois. Hoje os dois estão no fundo do mar de Recife (considerada a capital brasileira dos naufrágios, pela quantidade de embarcações que lá se encontram).

Além de imaginar os incríveis lances dessa história, quem mergulha nesses pontos sai renovado por observar um dos mais belos espetáculos da vida marinha brasileira. Na verdade, o que vem estimulando o crescimento do mergulho em naufrágio no Brasil é essa possibilidade de associar uma pesquisa histórica ao mergulho ao redor ou no interior de um navio e à contemplação da riqueza da vida marinha. Outra vantagem: “Nessa modalidade, o tempo não atrapalha o objetivo da viagem. Se o dia está claro, é possível filmar, fotografar o navio, o fundo do mar, a vida marinha. Se estiver fechado, é hora de observar detalhadamente as peças dos destroços”, diz Maurício Carvalho, que, depois de mergulhar por 25 anos – 15 só em naufrágios -, tornou-se um instrutor de instrutores desse tipo de mergulho.

CALOUROS E VETERANOS

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Marcelo Polato, outro mergulhador e pesquisador experiente – criou o Grupo de Pesquisas Subaquáticas (GPS) -, classifica os mergulhadores em dois tipos. O primeiro é formado por novatos encantados com a aura de mistério e de aventura dos navios afundados e com a possibilidade de contar às pessoas que lá no fundo do mar há muito mais do que peixinhos coloridos. Quando não desistem, essas pessoas acabam passando para o outro time, que reúne mergulhadores mais experientes, para os quais a atividade se torna um estilo de vida, não só um esporte de final de semana. “Nessa trupe estão pessoas com formação superior, idade entre 25 e 45 anos, que tendem a se especializar cada vez mais, principalmente porque os grandes navios, normalmente mais fundos e mais complicados para serem explorados, costumam exigir experiência e bons investimentos em equipamento para garantir a segurança”, diz Polato.

O caminho para fazer parte desse time de feras que saem pelo mundo afora em busca de novos naufrágios não é fácil. É preciso ter afinidade com a água, gostar de mergulhar, ter paciência para pesquisar, disciplina para obedecer as regras do esporte e um bom capital para bancar os custos de cursos, equipamentos, viagens e treinamentos. Para começar, é preciso fazer três cursos – o básico e o avançado de mergulho e o específico de mergulho em naufrágio, com um instrutor qualificado, capaz de transmitir todas as informações necessárias, desde como se comportar no fundo do mar para aproveitar os momentos, sem correr riscos (como o de aspirar gases prejudiciais, topar com passagens estreitas ou sedimentos que anulam a visibilidade), até o know-how que ajudará o iniciante a reconhecer o que verá nos destroços.

A complexidade da atividade é gradual. Primeiro se experimenta o ambiente recreacional – no qual o mergulhador fica a no máximo 40 metros de profundidade, como um observador externo. Só depois de ampliar os conhecimentos e praticar bastante é que irá explorar o interior do navio e usar misturas específicas de gases. “Muitos naufrágios estão em águas escuras, frias, com correntezas ou em grandes profundidades”, diz Maurício. “É preciso ter muitos recursos técnicos para enfrentar tais situações.”

Para Robert Zwirn, sócio da escola paulista Aquadive, poucos esportes são tão completos quanto o mergulho. “A pessoa encontra a adrenalina que procura quando dá o passo para entrar no mar, mas, a partir do momento em que está na água, tudo muda: o corpo passa a flutuar, os movimentos ficam mais fáceis, a pulsação diminui e a sensação de contemplar as maravilhas do fundo do oceano constitui endorfina pura”, diz Zwirn.

Com tantos atrativos, por que não se aventurar?

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Aventura no fundo do mar

Os oito melhores pontos de mergulho em naufrágio no litoral brasileiro

PRÍNCIPE DE ASTÚRIAS

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Nacionalidade: espanhola

Data do naufrágio: 6/3/1916

Localização: Ponta da Pirabura, em Ilhabela (SP)

Profundidade: 20 a 50 metros

Atrativo: o transatlântico, fabricado em 1914, chocou-se com um rochedo ao se aproximar de Ilhabela e afundou em cinco minutos. Morreram cerca de 470 pessoas. Apesar de muito dinamitado, atrai mergulhadores pela sua história. É conhecido como o “Titanic brasileiro”.

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PINGUINO

Nacionalidade: panamenha

Data do naufrágio: 26/6/1967

Localização: Enseada do Sitio Forte, em Angra dos Reis (RJ)

Profundidade: 7 a 20 metros

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Atrativo: o graneleiro, com 50 metros de comprimento, afundou depois de um incêndio na casa das máquinas. A facilidade de acesso, as águas calmas e as condições do navio (está inteiro) tornaram esse o naufrágio mais procurado pelos mergulhadores no Brasil.

ITAPAGÉ

Nacionalidade: brasileira

Data do naufrágio: 26/9/1943

Localização: Lagoa Azeda, perto de Maceió (AL)

Profundidade: 16 a 24 metros

Atrativo: durante a Segunda Guerra, foi atingido por dois torpedos lançados por um submarino alemão. Afundou rapidamente, causando a morte de 18 tripulantes e nove passageiros. Encontra-se em águas claras, com grande profusão de vida, e tem importante valor histórico.

BELUCCIA

Nacionalidade: inglesa

Data do naufrágio:

fevereiro de 1903

Localização:

Ilha Rasa, em Guarapari (ES)

Profundidade: 15 a 27 metros

Atrativo: fabricado em 1888, o vapor de 102 metros de comprimento chocou-se com a ilha enquanto transportava uma carga de café. Além dos destroços da embarcação, o mergulhador pode observar no local uma das maiores biodiversidades marinhas do país.

CORVETA IPIRANGA V17

Nacionalidade: brasileira

Data do naufrágio: outubro de 1983

Localização: Laje da Sapata, em Fernando de Noronha (PE)

Profundidade: 55 a 60 metros

Atrativo: a corveta, fabricada em 1953, estava em operação de patrulhamento quando bateu no local conhecido como Ponta da Sapata. Exige conhecimento técnico dos mergulhadores, dada a sua profundidade. Em compensação, a corveta exibe toda sua estrutura original.

NAU SACRAMENTO

Nacionalidade: portuguesa

Data do naufrágio: 5/5/1668

Localização: Baía de Todos os Santos, em Salvador (BA)

Profundidade: 15 a 32 metros

Atrativo: o galeão, construído em 1650, escoltava uma frota de 50 embarcações que trazia João Corrêa da Silva, que viria assumir o governo da Bahia. Afundou depois de bater no banco de areia Santo Antônio. É possível identificar várias partes dos destroços, como canhões e âncoras.

CAVO ARTEMIDI

Nacionalidade: grega

Data do naufrágio: 25/9/1980

Localização: entrada da Baía de Todos os Santos, em Salvador (BA)

Profundidade: 9 a 31 metros

Atrativo: o navio afundou com 16800 toneladas de ferro-gusa de uma companhia mineira, no maior naufrágio em costas brasileiras. Com 180 metros de comprimento, a embarcação pode ser fotografada de vários ângulos. As águas são claras e a vida marinha no local é exuberante.

ROSALINDA

Nacionalidade: italiana

Data do Naufrágio: 28/10/1955

Localização: Parcel dos Abrolhos (BA)

Profundidade: 0 a 20 metros

Atrativo: em sua viagem para Salvador, bateu e ficou encalhado nos recifes de Abrolhos. Os tripulantes foram resgatados. Atrai pelo seu tamanho (102 metros de comprimento), condições (está inteiro) e possibilidades de mergulho a partir do leme, que se encontra na superfície.

Fonte: Sistema de Informações de Naufrágios (Sinau), disponível no site https://www.naufragiosdobrasil.com.br

 

É de propósito mesmo

Naufrágios controlados estimulam a produção de vida marinha

Além dos quase 2 mil naufrágios ocorridos na costa brasileira, quem gosta de mergulho pode ver de perto o resultado dos afundamentos propositados de navios, uma prática que tem um objetivo claro: transformar a embarcação em recife artificial e, com isso, estimular o enriquecimento da fauna e da flora marinhas, em pontos previamente escolhidos. Até agora foram afundadas quase uma dezena de embarcações no país – entre as quais o cargueiro Victory 8B, no Espírito Santo. O navio, de bandeira grega, foi apreendido em 1997 e estava abandonado no porto de Vila Velha. Doado ao governo do Espírito Santo, foi afundado em julho passado. De acordo com Jorge Lemos, mergulhador e presidente da Fundação Cleanup Day (www.cleanupday.org.br), executora do afundamento do Victory 8B, o navio e a vida marinha que já se desenvolvem no local poderão ser observados tão logo o relatório sobre a segurança da exploração para a prática de mergulho em naufrágio esteja concluído e seja submetido a organismos ambientais. “Estamos instalando placas de sinalização, preparando rotas, seguindo todos os padrões internacionais de segurança do mergulho em naufrágio”, diz Lemos.

Serviço

SAIBA MAIS

https://www.brasilmergulho.com

https://www.naufragiosdobrasil.com.br

https://www.naufragios.com.br

E nas escolas de mergulho com certificação internacional (Padi, PDIC, Naui, SSI)

EQUIPAMENTOS BÁSICOS

Preços mínimos: máscara (R$ 52), nadadeira (R$ 62), respirador (R$ 13), fivela extra (R$ 10), carretilha (R$ 248), bússola (R$ 179), lanterna primária (R$ 270), lanterna secundária (R$ 88), prancheta sub (R$ 20). Além disso, regulador completo, colete equilibrador, cilindro e roupa, que podem ser alugados por cerca de R$ 15 a diária por item.

DICAS DE ALIMENTAÇÃO

O mergulho recreacional não demanda grande esforço físico, mas é importante estar bem alimentado para evitar problemas, como câimbras. Convém evitar gorduras e produtos que causem alterações no sistema circulatório. Dieta hipercalórica pode evitar a hipotermia (queda anormal da temperatura do corpo).

OUTRAS DICAS

Preços dos cursos: autônomo básico (R$ 230), autônomo avançado (R$ 190), naufrágio (R$ 325). Incluem módulos de teoria, de piscina e material didático.

Fonte: Aquadive, SP

 

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