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Esforços da China para salvar pandas deram certo – mas ignoraram leopardos

Enquanto pandas caminham para longe da extinção, leopardos já sumiram em 81% das áreas protegidas do país, assim como outros carnívoros.

Por Bruno Carbinatto
6 ago 2020, 18h50

Por décadas, a China apostou em medidas de conservação para salvar os pandas-gigantes, os fofos e grandes ursos amados internacionalmente (apesar de só existirem no país asiático). Funcionou: em 2016, o status da espécie moveu de “ameaçada” para “vulnerável”, que indica um menor nível de preocupação.

Mas o aparente sucesso pode esconder um lado ruim da história: ao mesmo tempo em que as populações de pandas aumentavam, as de leopardos e outros carnívoros começaram a diminuir nos mesmos locais – e foram ignoradas pelas medidas de proteção ambiental do país.

Foi o que concluiu um estudo publicado recentemente na revista Nature Ecology & Evolution, feito por pesquisadores chineses e americanos. A equipe analisou 73 áreas protegidas no interior da China, incluindo 66 reservas que são consideradas específicas para pandas-gigantes. Usando dados de câmeras instaladas nas selvas e de outras pesquisas, o artigo não analisou a presença de pandas nas regiões, mas sim de quatro animais carnívoros que habitam os mesmos locais: leopardos, leopardos-das-neves, lobos e cães-selvagens-asiáticos (também chamados de dholes).

Os resultados impressionam: desde que as reservas foram estabelecidos, entre 50 e 60 anos atrás, os leopardo-das-neves sumiram de 38% dos territórios analisados. Já os lobos não estão mais presentes em 77% das áreas protegidas; entre os leopardos, esse número é de 81%. Mais impressionante ainda é a redução territorial dos cães-selvagens-asiáticos, que chegou a atingir 95% de todas as reservas, segundo o estudo. Em alguns locais, essas espécies estão consideradas funcionalmente extintas, o que significa que até podem existir alguns indivíduos, mas o número é tão pequeno que quase não faz diferença para o ecossistema.

Os números são alarmantes, especialmente porque os quatro carnívoros atuam como predadores importantes na cadeia alimentar das regiões, e um desaparecimento desses animais afetaria o habitat como um todo.

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Por que esses animais estão desaparecendo?

No estudo, os pesquisadores explicam que a redução dessas populações resulta de uma combinação de fatores, como o desmatamento, a caça furtiva dessas espécies (e de outros animais que servem como presa) e o espalhamento de doenças. Os leopardos-das-neves parecem ter sido menos afetados porque habitam regiões montanhosas e estão mais distantes de comunidades humanas.

O fenômeno pode ser explicado, em partes, pelo modo como as reservas foram criadas no século passado. Na época, os pandas eram o centros das atenções de cientistas e ambientalistas pelo mundo por estarem severamente ameaçados de extinção. Esses ursos são conhecidos por terem uma reprodução em cativeiro muito difícil e, por isso, conservar as populações na natureza era algo essencial. O governo chinês, então, começou a estabelecer áreas protegidas para evitar o desmatamento e a caça dos bichos.

A medida foi vista com bons olhos, e acreditava-se que, apesar de ser focada em salvar os pandas, traria bons resultados para todas as espécies que vivem na região (afinal, proteger áreas selvagens é sempre algo positivo). Acontece que os projetos de conservação foram pensados especialmente para pandas, e nem tudo o que funciona para esses ursos é igual para outras espécies. Esses animais necessitam de até 20 vezes menos território do que os leopardos, que caçam em áreas muito maiores, por exemplo.

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Além disso, os carnívoros precisam se alimentar de presas que são menos abundantes do que bambu, o almoço favorito dos pandas. Eles também são mais visados por caçadores ilegais, que matam as espécies por esporte ou porque as consideram perigosas.

Por isso, as reservas ambientais podem ter passado uma falsa ideia de que essas espécies também estariam protegidas baseado apenas no sucesso dos pandas. Mas na verdade as áreas protegidas não cobrem todo o território habitado por leopardos e outros carnívoros, que acabam sofrendo as consequências negativas ao viver em áreas fora das reservas de pandas.

Os pesquisadores alertam para a necessidade de se pensar em medidas de conservação mais abrangentes, que não foquem em apenas uma espécie. O caso chinês não é o primeiro a fazer isso: na Índia, as populações de leopardo também diminuíram em áreas protegidas focadas nas populações de tigre do país.

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Apesar das quedas acentuadas, os autores do artigo ressaltam que ainda há tempo de reverter a tendência, mesmo que sejam necessários esforços de décadas. A restauração dos habitats para além das reservas dos pandas é algo urgente, além da reintrodução de espécies que servem como presas para esses animais. Também são necessárias a fiscalização e a educação de comunidades locais, já que a coexistência de humanos e carnívoros grandes é possível, desde que existam medidas necessárias para evitar conflitos.

Segundo os pesquisadores, o momento é propício para o estabelecimento dessas medidas, e a melhor parte é que não é preciso ignorar os pandas: a China está construindo sua maior reserva ambiental da história, com mais de 27 mil quilômetros quadrados – área considerada grande o suficiente para conservar tanto as espécies dos ursos como os carnívoros ameaçados.

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