Encontrado elo perdido entre jacarés e dinossauros
O Teleocrater, réptil que viveu há 245 milhões de anos, já é parente dos dinossauros que viriam depois – mas tinha características dos crocodilos atuais
Na ciência, as aparências enganam. Imagine a cena: é a última pergunta de um programa de auditório em rede nacional, e se você acertar, leva alguns milhares de reais para casa. No telão, aparecem duas fotos. (1) Um passarinho simpático, como um joão-de-barro. (2) Um jacaré escamoso com os dentes afiados de fora. Pergunta: qual desses animais é um parente mais próximo dos dinossauros?
O jacaré? Errado. Os pássaros contemporâneos são da ordem dos saurísquios, subordem dos terópodas – na árvore da evolução biológica, esse é o mesmo ramo do terrível Tiranossauro rex. Já os crocodilos e jacarés atuais são de outra linhagem, que se separou da que daria origem aos dinossauros há 245 milhões de anos, no comecinho do período Triássico.
Agora, um grupo de pesquisadores da Universidade Estadual da Virgínia, nos EUA, encontrou um fóssil que está justamente nesse ponto crucial da evolução, quando ocorre a divisão. O Teleocrater (Teleocrater rhadinus), retratado na ilustração acima, anda nas quatro patas e tem outras características semelhantes às dos crocodilos – mas é, na prática, ancestral dos dinossauros, e um dos primeiros representantes do ramo dos pássaros. No esquema abaixo, simplificado, é possível entender seu lugar na família.
“Os dinossauros foram animais muito bem-sucedidos. É natural querer saber de onde eles vieram e porque eles se tornaram tão dominantes. O Teleocrater é muito animador porque ele abre buracos em muitas teorias clássicas sobre a origem dos dinossauros”, afirma Richard Butler, um dos autores do estudo. “Ele desafia ideias pré-concebidas que tínhamos sobre os ancestrais desses animais”. É bom lembrar: na época em que o T. rhadinus andou por aí, os dinos ainda não existiam – os primeiros exemplares surgiram há 230 milhões de anos, só 15 milhões de anos depois. Há poucas informações sobre como foi esse período de transição, e o Teleocrater é valioso para preencher essa lacuna.
Butler e seus colegas não precisam cavar fundo para encontrar fósseis de Teleocrater – boa parte dos que foram analisados no artigo científico já haviam sido encontrados no norte da Tanzânia, na África, em 1933. Na época, o responsável pela descoberta, Rex Parrington, não conseguiu, pela falta de determinados ossos, classificar o animal. Os esqueletos estavam guardados no Museu de História Natural de Londres desde então. “É incrível pensar que levou mais de 80 anos para a real importância científica desses fósseis ser compreendida e publicada”, disseram os pesquisadores. “Nossa descoberta demonstra o valor de manter e voltar a analisar coleções históricas: muitas descobertas novas podem ser feitas observando o material de museus com novos olhos.”