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Carta náutica do século 19 revela perda de até 49% dos recifes em Abrolhos (BA)

É a primeira vez que pesquisadores brasileiros usam documentos históricos para compreender a evolução das condições ambientais de recifes. Entenda.

Por Luisa Costa
Atualizado em 30 jun 2022, 10h01 - Publicado em 24 jun 2022, 15h59

Entre os nove milhões de itens que compõem o acervo da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, está uma carta náutica de 1861, elaborada pelo francês Ernest Mouchez durante uma expedição à Bahia. 

Conchas, rochas, corais, areia. Ali está mapeada toda a antiga paisagem subaquática de Abrolhos, arquipélago que abriga as maiores formações de recifes e a maior biodiversidade marinha do Atlântico Sul.

A viagem de Mouchez era um trabalho de exploração da América do Sul, e o documento foi um dos muitos criados para registrar as descobertas da época – além de fornecer pistas à navegação daquelas águas. Mas agora, 160 anos depois, encontrou-se uma nova utilidade à carta: entender como os recifes mudaram de lá para cá.


Um grupo de pesquisadores brasileiros comparou as informações contidas na carta náutica e em outros documentos históricos com dados modernos sobre as condições ambientais de Abrolhos, obtidos via satélite. Assim, descobriram que houve uma perda média de 28% na extensão espacial dos recifes da região.

Algumas áreas estão ainda mais degradadas. Entre os recifes mais próximos à costa, por exemplo, a perda dos últimos 160 anos é de 49%. O estudo foi publicado nesta quarta (29) na revista Perspectives in Ecology and Conservation.

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Motivos da degradação

Segundo os pesquisadores, os recifes foram prejudicados principalmente por uma antiga prática de extração de corais. Blocos inteiros eram removidos dos recifes para a fabricação de cal e, acredite, a substituição de tijolos na construção civil. Há registros desse costume desde o século 17, e ele durou pelo menos até 1900 na região.

“Depois, houve uma intensificação na sedimentação costeira gerada pelo aumento no desenvolvimento urbano e degradação [ambiental] das áreas costeiras”, explica à Super Carine Fogliarini, autora principal do estudo e pesquisadora da Universidade Federal de Santa Maria (RS).

Agora, os recifes de Abrolhos enfrentam outros problemas, como a poluição urbana – o lançamento de contaminantes ou excesso de matéria orgânica na água – e o aquecimento global. O aumento de temperatura da água pode levar à morte de corais que compõem os recifes, a partir de um fenômeno chamado “branqueamento”: com o estresse térmico, esses organismos expulsam microalgas que contribuem com sua cor e são sua principal fonte de energia.

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Método incomum

É a primeira vez que pesquisadores brasileiros usam documentos históricos para compreender a evolução das condições ambientais de recifes. Segundo Fogliarini, embora os documentos sejam fontes de informação importantes para entender mudanças de longo prazo na paisagem marinha, existem obstáculos para sua utilização.

“O maior desafio desse método é compilar e organizar as informações desses documentos, que muitas vezes estão espalhados em museus, bibliotecas e demais acervos do Brasil e do exterior”, explica. “Além disso, muitas dessas informações estão contidas em livros antigos, escritos em latim, francês, alemão e português arcaico. E com frequência esses materiais não estão digitalizados ou são de difícil acesso.”

Esse método de estudo é mais comum em países da Europa e da América do Norte, e em investigações relacionadas a ecossistemas terrestres, que concentram mais dados históricos.

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Para esta investigação, além da carta náutica de Mouchez (que você pode ver neste link), os cientistas usaram relatos de naturalistas e navegadores europeus que visitaram Abrolhos durante expedições científicas desde 1800.

“Coletivamente, esse conjunto de informações históricas captura as mudanças dos recifes de corais ao longo do tempo e ajuda a atualizar as metas de conservação e restauração da paisagem marinha dos recifes de Abrolhos”, escrevem os pesquisadores.

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