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Alumínio em excesso na água afeta sêmen e causa malformações em embriões de peixe

Grupo da USP descobre que alterações na temperatura, acidez e concentração de metais são suficientes para afetar a reprodução de lambaris – mesmo quando os rios não estão perceptivelmente poluídos.

Por Bruno Vaiano Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 16 ago 2022, 13h35 - Publicado em 15 nov 2020, 18h12

No imaginário popular, rio poluído é sinônimo de esgoto a céu aberto. Mas muitos corpos d’água estão contaminados de maneiras mais sutis – imperceptíveis para quem dá um mergulho, mas mesmo assim bastante danosas para os ecossistemas. 

O biólogo João Paulo Pinheiro se dedica a estudar os problemas que o alumínio causa na reprodução de peixes. Ele integra a equipe do Laboratório de Metabolismo e Reprodução de Organismos Aquáticos, na Universidade de São Paulo (USP), que investiga como metais e outros resíduos discretos da atividade humana – como fármacos – afetam a vida debaixo d’água. 

“Em quase todos os lugares em que nós trabalhamos existe pesca e lazer. A poluição não é perceptível”, diz João, que coleta amostras no interior de São Paulo. “Além disso, o alumínio que nós estudamos está presente naturalmente no rios – vem da erosão de rochas. O problema é que ele aparece em uma concentração anormal graças à atividade humana.”

O grupo da USP trabalha até com a água de partes mais limpas do Rio Tietê  – o rio é razoavelmente bem conservado em sua nascente, embora o trecho que cruza a capital paulista seja famoso pelo cheiro (só as capivaras, com sua paciência plácida, aguentam). 

O trabalho mais recente de João e seus colegas – publicado no periódico científico Chemosphere – trata de um peixe denominado Astyanax altiparanae, que você e seu estômago provavelmente conhecem por outro nome: lambari. Mais precisamente, lambari-tambiú. 

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Em laboratório, a equipe liderada pela professora Renata Moreira avaliou como mudanças na temperatura, na acidez e na quantidade de alumínio diluído na água afetam as propriedades bioquímicas do sêmen produzido pelos machos dessa espécie. 

A temperatura da água variou entre 20 °C  e 25 °C e o pH foi de 5,5, mais ácido que o neutro, que é 7. 

Além de reduzir a qualidade do sêmen, o metal, o calor e pH baixo afetam o desenvolvimento dos peixes bebês tanto no estágio embrionário (ainda dentro dos ovos) quanto no estágio larval (depois que os ovos eclodem). 

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Os machos que vivem em águas com níveis anormais de alumínio têm dificuldades em fecundar os ovos. Quando a fertilização é bem-sucedida, o número de ovos que efetivamente eclode é menor, e o número de larvas com malformações aumenta. 

Esses resultados reforçam conclusões de outros dois artigos sobre alumínio publicados pelo grupo de João em 2019 e no meio de 2020, que analisaram outros parâmetros. Os pesquisadores observam de tudo: do formato da cabeça e do flagelo (o “rabinho”) dos espermatozoides a sua motilidade, ou seja: quantos deles nadam com vigor e quantos ficam largados por aí. 

Pode parecer óbvio que peixes que vivem em águas poluídas tenham um desempenho pior em todos os estágios de sua reprodução. Mas lembre-se: não estamos falando de um rio sufocado por esgoto. Para um leigo, essas podem soar como alterações discretas no equilíbrio do habitat. 

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É uma demonstração clara de algo que o naturalista alemão Humboldt –  que foi um ambientalista antes de existirem ambientalistas –, já havia percebido no século 18: a natureza é interconectada, o que a torna vulnerável como um tecido. Se você puxa um fio, toda a trama pode se desmanchar. 

O ser humano, claro, é parte da trama: os peixes são a porta de entrada do alumínio e de outros metais na cadeia alimentar. Esses elementos pesadinhos da tabela periódica, que passam de animal para animal, também fazem mal a mamíferos como nós. Concentrações anormais de alumínio em seres humanos já foram associadas, por exemplo, à doença de Alzheimer.

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