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A vida privada de Stephen Hawking

Ele não era apenas um gênio paralisado. Também foi um aventureiro que viajou o mundo - e adorava clubes de striptease

Por Thais Harari e Bruno Garattoni
Atualizado em 25 nov 2020, 10h03 - Publicado em 31 ago 2014, 22h00

Ao completar 72 anos, em janeiro de 2014, Stephen Hawking fez uma coisa chocante. Escreveu um artigo dizendo que os buracos negros, elemento central do seu trabalho como físico, não existem da forma que imaginamos. Uma mudança de posição radical – que não diminui nem invalida a obra de Hawking, mas deixou cientistas perplexos e gerou especulações sobre o futuro do físico. Talvez ele não estivesse bem de saúde, e começasse a divulgar seu legado intelectual definitivo. Essa impressão foi reforçada porque, em setembro seguinte, Hawking teve duas atitudes suspeitas. Primeiro, defendeu o suicídio assistido (que sempre, e famosamente, considerou “um grande erro”), e lançou uma autobiografia na qual resume a própria vida. É um livro pequeno, de 144 páginas, porque ele estava com muita dificuldade de se comunicar – cada vez mais paralisado, na época só conseguia escrever uma palavra por minuto, usando o queixo para selecionar palavras numa tela. Redigir o livro deve ter sido um enorme esforço. Mas, depois de revolucionar a física, Hawking queria contar sua história.

Stephen William Hawking nasceu saudável em Oxford, na Inglaterra, em 9 de janeiro de 1942 – no exato aniversário de 300 anos da morte de Galileu Galilei. O pai era médico, a mãe formada em filosofia, e o pequeno Stephen era o caçula de quatro irmãos numa casa cheia de livros empilhados – e ideias apimentadas. “O que mais me impressionava eram as conversas durante o almoço”, conta John MacClenahan, amigo de infância de Hawking. “Eles discutiam coisas que jamais seriam comentadas na minha casa, como sexo e aborto”. Quando Hawking tinha oito anos, a família se mudou para a periferia de Londres. Não deu muito certo. Eles eram considerados esquisitos pelos vizinhos, e na escola o menino logo ganhou o apelido de “Einstein”. Deve ter sido pela aparência, porque bom aluno Hawking não era: fazia os trabalhos sem capricho e sua caligrafia era um terror. Odiava matemática, que achava fácil demais. Gostava de física e astronomia – porque ajudavam a entender questões existenciais, como de onde viemos e por que estamos aqui. “Eu queria sondar as profundezas do Universo”, escreveu em seu livro.

Hawking era precoce. Com 17 anos, ganhou uma bolsa para estudar física na Universidade de Oxford. Os colegas eram dois anos mais velhos, e ele se sentiu sozinho e deslocado. Mas, no terceiro ano de faculdade, se inscreveu no clube de remo para tentar fazer amigos. Os barcos navegavam um atrás do outro, e cada timoneiro segurava uma linha para manter a distância correta em relação ao barco da frente. Hawking deu mancada logo na estreia. Deixou a linha escapar, ela se enroscou no leme, o barco saiu de curso – e sua equipe foi desclassificada. Apesar disso, ele conseguiu fazer alguns amigos, e passou a frequentar o que chama de “seu passatempo favorito”: as festas estudantis. Estudava bem pouco, uma hora por dia, mas mesmo assim foi aceito no mestrado da Universidade de Cambridge.

Antes de começar, ele teria alguns meses de férias. Resolveu se candidatar a uma bolsa de viagem (com as despesas pagas pela universidade). Para aumentar as chances de ganhar, escolheu um destino distante e impopular entre os alunos: Irã. Deu certo, e Hawking foi passar as férias lá. Péssima escolha. Ele pegou o gigantesco terremoto Bou’in-Zahra, que arrasou o país e deixou mais de 12 mil mortos. Hawking estava bem perto do epicentro, mas diz que não percebeu nada – pois estava viajando dentro de um ônibus que balançava muito. Em determinado momento, o motorista freou forte e ele foi jogado contra o banco da frente, quebrando uma costela. Como não falava o idioma local, demorou um tempão até descobrir o que tinha acontecido. Só quando a excursão chegou a Istambul, aproximadamente dez dias depois, Hawking soube que havia encarado um megaterremoto – do qual saíra praticamente ileso. Mas o pior ainda estava por vir.

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O acidente de patins

De volta à Inglaterra, o jovem físico percebeu que estava ficando cada vez mais desastrado. Caía, derrubava objetos, parecia não controlar direito o que fazia. Um dia, caiu de patins e não conseguiu levantar. Foi levado a um médico, que o diagnosticou com esclerose lateral amiotrófica (ELA), uma doença incurável que leva à perda de movimentos – e, segundo o médico, levaria à morte em no máximo três anos. Hawking tinha 21. Ele ficou internado num hospital, onde viu um garoto morrer de leucemia. “Toda vez que fico inclinado a ter pena de mim, me lembro daquele menino”, disse.

Teve alta, foi para casa e, pouco tempo depois, conheceu Jane Wilde, amiga de uma de suas irmãs. Namoraram e casaram (ele se apoiou numa bengala durante a festa). Mas Hawking foi piorando, não conseguiu mais cuidar dos filhos e, em 1970, parou de andar. Para se locomover, começou a usar uma cadeira de rodas e um carrinho elétrico de três rodas. Com seu típico bom-humor, contava que às vezes usava o carrinho para dar carona: “Eu transportava passageiros ilegalmente”.

Nessa época, Hawking já era um físico conhecido, e foi convidado a trabalhar no Instituto de Tecnologia da Califórnia. Aceitou e a família se mudou para os EUA. Ele e Jane já tinham três filhos, mas o casamento não ia bem. Ela começou a ter um caso com Jonathan Jones, músico e tocador de órgão que conheceu numa igreja local, e acabou convidando o amante para morar junto com a família. Hawking diz que ficou contrariado, mas não se opôs. Ele achava que ia morrer logo, e queria alguém que pudesse sustentar os filhos. O ano era 1979.

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Nos anos seguintes, sua saúde piorou muito. Passava longos períodos com falta de ar e, em 1985, durante uma viagem à Suíça, pegou uma pneumonia. Ficou tão debilitado que os médicos sugeriram desligar o respirador artificial que o mantinha vivo. Jane não aceitou e levou o marido de volta para Cambridge. Lá, Hawking foi submetido a uma traqueostomia, cirurgia que colocou um tubo de ar em sua garganta, facilitando sua respiração. Isso salvou sua vida, mas ele nunca mais falou. A partir daí, o físico se comunicaria usando um computador – com a voz eletrônica pela qual é conhecido. De lá para cá, surgiram sintetizadores que produzem um tom de voz mais natural. Mas Hawking preferiu continuar soando como robô: “Não vou trocar [de voz]”.

Em 1988, veio o grande momento de sua carreira. O físico publicou Uma Breve História do Tempo, livro que fala sobre a origem do Universo. Apesar do tema complexo, Hawking tentou escrever em linguagem simples, para leigos. Acertou em cheio: o livro se tornou um sucesso gigantesco, vendeu 10 milhões de cópias e foi traduzido em mais de 30 idiomas. E Stephen Hawking virou o cientista mais famoso do mundo.

Em 1995, ele pediu o divórcio de Jane e se mudou para outro apartamento, no qual morava com uma de suas enfermeiras, Elaine Mason. Eles se casaram, e Hawking viveu uma vida aparentemente feliz, com direito até a algumas aventuras. Em 2003, ele foi visto na Stringfellow’s Cabaret, uma casa de striptease em Londres. Hawking estava na cidade comemorando o noivado da filha e, para aproveitar a noite, foi até a boate junto com um assistente e duas enfermeiras. Ele nunca comentou o caso, mas há provas: uma foto sua ao lado de Peter Stringfellow, dono do cabaré, e outra com o cientista rodeado por cinco strippers sorridentes. Hawking teria repetido a dose na Califórnia, onde supostamente frequentou uma boate de sexo. Quando a imprensa descobriu, a Universidade de Cambridge negou, dizendo que ele tinha ido “uma vez apenas”.

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A vida conjugal de Hawking foi marcada por episódios de violência doméstica. Em 2000, ele foi parar no hospital, com cortes e hematomas, mas negou ter sido vítima de maus-tratos (e não quis dizer como tinha se machucado). Em 2003, Lucy, uma das filhas do cientista, disse que ele apanhava da esposa. Em 2007, uma enfermeira fez a mesma acusação, dizendo que Elaine agredia e humilhava Hawking – batendo em seus braços, fazendo-o engolir água durante o banho e deixando-o sob o sol escaldante por horas. O físico não comentou o caso, mas se separou da esposa naquele mesmo ano. Foi morar numa casa em Cambridge, onde esteve até o final, com uma governanta.

Os problemas de saúde podem ter trazido enormes dificuldades, mas não fizeram Hawking ficar parado. Tirando a Oceania, ele esteve em todos os continentes. Andou de submarino, voou num balão e até num voo da empresa americana Zero Gravity, em que o avião faz uma série de manobras para produzir uma situação de gravidade zero. “Me senti livre da minha doença”, ele relatou.

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