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Como alimentar 10 bilhões de pessoas

Esse será o tamanho da população mundial em 2050, segundo a ONU. Não será fácil produzir comida para todo mundo. Mas a ciência já tem algumas respostas

Por Daniel Azevedo
Atualizado em 3 abr 2019, 15h46 - Publicado em 29 set 2014, 22h00

Para alimentar mais alguns bilhões de terráqueos, o lema entre cientistas e empresas é: produzir mais com menos. Para começar, é possível verticalizar a produção. Estamos falando de pilhas de miniestufas, prédios-horta que ocupariam muito menos área territorial para produzir muitas variedades de verduras e hortaliças. Em cada andar dessas estruturas poderia se criar um ambiente controlado, permitindo desenvolver todo o potencial genético das culturas e mais colheitas por ano.

Com o clima e manejo perfeitos, é possível triplicar a produtividade de rúcula, quadruplicar a de pimentão. Com tomates, a performance vai de 9 kg/m² para 80 kg/m², 800% de aumento. Uma verdadeira “fábrica” de hortifrútis. A técnica é muito cara para culturas que exigem maior escala, como grãos; ainda assim, pesquisadores brasileiros colheram 15 toneladas de trigo em um hectare (10 mil m2) controlado, quando a média é de apenas duas toneladas. Outra solução nesse sentido é a hidroponia, em que o vegetal é “plantado” em uma solução nutritiva de água e sais minerais num ambiente fechado. (Quando a solução é vaporizada, chama-se aeroponia.) A absorção de nutrientes é facilitada, as plantas crescem 50% mais rápido e costumam ter o dobro de volume – 4 m² podem render 30 pés de alface por mês. No Japão, a técnica já é utilizada para produzir vegetais até no subsolo de restaurantes. No futuro, se cada condomínio tivesse uma horta hidropônica, além de legumes e verduras fresquinhos, reduziríamos o trânsito, a poluição e abriríamos “espaço” para outras culturas no campo.

O prédio também pode ter inquilinos animais. Isso porque muitas pesquisas indicam que o gado e as aves se desenvolvem melhor quando suas “condições de vida” são mais confortáveis. O exemplo literal de mais com menos é a produção moderna de peixes. As tilápias em aquários chegam a ganhar 1 kg vivo com apenas 760 gramas de ração. A explicação é que elas também comem algas microscópicas que surgem espontaneamente nos reservatórios.

Por falar em algas, seu potencial de crescimento impressiona: pesquisadores de uma empresa brasileira conseguiram gerar 20 toneladas de matéria seca a partir de apenas 150 ml da alga Chlorella em nove dias. Verdade que, por enquanto, algas são mais usadas para produzir biocombustíveis, o que, de certa maneira, já é bom para liberar espaço para lavouras.

Mas nada supera o aproveitamento do que a ONU classificou como “uma excelente alternativa para alimentação da humanidade”, “rica em nutrientes, barata, ecológica e deliciosa”: insetos. Com técnicas apropriadas, traças, besouros e gafanhotos poderiam ser produzidos em casa, em recipientes de até 1 kg, garantindo 10% da dieta. Antes de virar a cara, saiba que estamos falando só do filé, o 1% comestível do conjunto de 1,5 milhão de espécies.

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Genes contra a fome

As fundações dos edifícios-fazenda do futuro estão surgindo nos laboratórios de hoje. A seleção genética é uma velha aliada, permitindo que animais gerem mais carne com menos ração. Exemplo: em 1970, para engordar 1 kg, um suíno precisava comer 4 kg; hoje, precisa comer 2 kg; até 2030, será apenas 1,6 kg. Tudo isso pela escolha dos exemplares com melhores genes, sem qualquer hormônio. Na agricultura, especialistas calculam que a genética contribuiu com 2/3 do aumento de produtividade que as lavouras tiveram nos últimos 50 anos, a chamada Revolução Verde. (O resto se deve à evolução do manejo e dos melhores defensivos.) Até 2050, ela deve permitir mais 1/3 de produtividade, e até quadruplicar culturas cruciais como trigo ou cana.

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Também já se investe muito em nutrigenômica, a interação entre a nutrição e os genes. Funciona assim: técnicas de mapeamento em nível molecular identificam os genes de interesse comercial que estão “desligados” e, a partir dos nutrientes certos, eles são ativados. Os animais alcançam o peso ideal comendo 20% menos ração – produzida com 75% menos minerais. Isso melhora a quantidade e a qualidade da carne produzida.

A próxima aposta é a nanotecnologia, que poderia ser uma alternativa aos transgênicos. Em vez de inserir um gene exótico na planta, a técnica permitiria “colar” nanopartículas no DNA sem alterá-lo. Isso possibilitará enriquecer os alimentos com vitaminas e outros nutrientes. Além disso, reduziria o uso de defensivos agrícolas – com um combate muito mais eficiente a doenças e pragas. Essas intervenções em nível atômico trariam benefícios na produtividade em geral, na minimização de perdas e na redução do impacto ambiental.

Cultivo controlado urbano. Novas técnicas de produção. Modificação em laboratório. Insetos e algas no cardápio. São avanços que podem resolver o problema de alimentação do mundo, mas que também podem trazer consequências inesperadas. A Revolução Verde deixou um legado de danos ambientais, exagero no uso dos agrotóxicos e modelos de produção que estão se esgotando. Da mesma forma, esta nova revolução também pode trazer obstáculos inesperados. Faz sentido trazer produção a agrícola e pecuária para metrópoles onde a falta de água já é um risco real? Soluções podem trazer novos problemas.

Mas, com ou sem edifícios-horta, uma solução é necessária. Ou vai faltar comida no prato.

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Avanços no prato

Nutrigenômica

Alimentos que ligam genes bons aumentam a produção pecuária.

Bem-estar animal

Pesquisas mostram que rebanhos bem cuidados rendem mais.

Concentração de CO²

Há provas de que ele turbina lavouras. Ponto para fazendas urbanas.

Nanotecnologia

Partículas que deixam a planta imune a doenças e pragas.

Sem desperdício
Otimizar o processo é chave: hoje, 1/3 dos alimentos vai para o lixo.

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Condomínio fazenda

Verticalizar a produção de comida já é possível. No futuro, deve ser comum

Ciência contra a fome
(Inara Negrão/Pedro Piccinini)

1. Cobertura

Ambientes controlados: no Japão, restaurantes e famílias já têm suas próprias hortas hidropônicas – às vezes até no subsolo. A produção controlada de cereais é mais cara, mas pesquisadores brasileiros já testaram a técnica em um hectare de trigo e conseguiram quintuplicar sua produtividade.

2. 3º andar

Algas: elas são excelentes fontes de proteína e algumas espécies são capazes de quadruplicar sua biomassa a cada dia. Só isso seria motivo para imaginá-las cada vez mais presentes no cardápio humano.

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3. 2º andar

Insetos: a ONU recomenda. Um recipiente de 1 kg é o suficiente para garantir 10% da dieta de uma família. Além do alto índice de proteína (barata, 60%, boi, 28%), são ecológicos: com a mesma ração de um bovino, geram oito vezes mais comida.

4. 1º andar

Fábrica hortifrúti: o gerenciamento do clima e o manejo científico da horta geram um crescimento exponencial da produção de alimentos como tomate, rúcula, pimentão e pepino.

5. Térreo

Peixes e pecuária: na piscicultura, os peixes ganham mais peso do que comem – beliscam microalgas que se formam nos tanques. E a criação moderna de gado e aves alia espaços pequenos com bem-estar animal.

6. Subsolo

Aves e Suínos: melhorar as “condições de vida” aumenta a produtividade. Porcos ganham massageadores e brinquedos, e aves ganham mais espaço e ar-condicionado.

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