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A ciência ainda é terra de homens. Conheça 7 brasileiras que estão mudando isso

O Prêmio Para Mulheres na Ciência reconheceu sete pesquisadoras no Brasil. No mesmo dia, um relatório da Unesco mostrou que nas ciências exatas e biológicas, ainda estamos longe da igualdade

Por Ana Carolina Leonardi Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 27 out 2017, 19h20 - Publicado em 27 out 2017, 18h30

Em meio à crise da ciência no Brasil, sete pesquisadoras receberam, na última terça-feira, o Prêmio Para Mulheres na Ciência, criado em 1998 para estimular a presença de mulheres em áreas da pesquisa em que elas foram, historicamente, preteridas.

O dia de entrega do Prêmio, 24 de outubro, coincidiu com a divulgação do novo Relatório de Monitoramento Global da Educação 2017-2018 da Unesco — uma das promotoras do prêmio, junto a L’Oréal e a Academia Brasileira de Ciências. E o que o relatório mostra é exatamente o que as laureadas deste ano experimentam no dia a dia da pesquisa científica: no mundo todo, os índices de mulheres na universidade está aumentando.

Já há mais mulheres do que homens fazendo curso superior. O problema é que cursos chamados STEM (ciências, tecnologia, engenharia e matemática) — as áreas que o Para Mulheres Ciência premia anualmente — tem uma falta notória de mulheres.

Exceções começaram a aparecer: Albânia, Algéria e Tunísia formam mais mulheres em ciências exatas e biológicas do que homens. Mas a maioria dos países mostra o contrário. No Chile, em Gana e na Suíça, menos de ¼ das salas de aula desses cursos é composta por mulheres.

Dentro das carreiras de pesquisa, essa disparidade tende a aumentar conforme cresce a importância do cargo. “A parcela de mulheres em papéis de liderança diminui na medida em que os níveis [educacionais] aumentam”, aponta o relatório. Mesmo antes da carreira acadêmica, na própria educação básica, essa é a tendência nos cargos de gestão. A educação infantil e o ensino fundamental, no mundo todo, são repletos de professoras mulheres, mas elas são minoria como educadores de ensino médio e nos cargos de direção escolar.

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É exatamente essa questão que experimentaram as vencedoras do prêmio. “Não vejo diferença na quantidade de mulheres que atuam na área, o que eu vejo é a diferença no andamento da carreira”, diz Pamela Carpes, neurocientista que se dedica a avaliar nos mamíferos as consequências cerebrais do abandono parental na infância. “A ascensão a cargos de prestígio, presidências de sociedade, é diferente. Sou membro da Sociedade Brasileira de Fisiologia, que existe há anos. Estamos, neste ano, apenas na segunda mulher presidindo — mesmo que haja mais mulheres [como membros] do que homens.”

Outras laureadas confirmam essa percepção: “Já existem dados que comprovam que, a partir dos 30 anos, muitas mulheres desistem da carreira científica. Esse é o grande gargalo, que é exatamente na fase em que nós [as premiadas] estamos”, diz Jenaína Soares. A pesquisadora da Universidade Federal de Lavras, premiada na categoria Física, estuda nanofolhas: materiais em escala nanométrica, 50 mil vezes menos que um fio de cabelo, cujos átomos se organizam bidimensionalmente, em uma única camada. Para um tamanho tão pequeno, materiais desse tipo, como o grafeno, são extremamente resistentes e, ao mesmo tempo, leves. Outros materiais, quando organizados da mesma forma, ainda apresentam propriedades de condução elétrica e magnetismo. Por causa dessas características curiosas, os nanomateriais são as “meninas dos olhos” dos grandes setores industriais.

Crise econômica

Neste cenário já complicado, se acrescenta a dificuldade crescente de fazer ciência no Brasil, para pesquisadores de todos os gêneros. Os cortes federais no orçamento voltado à ciência e à tecnologia renderam, inclusive, uma carta de protesto assinada por 23 vencedores do prêmio Nobel diretamente ao presidente Michel Temer. A situação nas universidades é parecida.

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A crise financeira foi destacada no discurso das vencedoras. Uma delas, a bioquímica Fernanda Tonelli, está buscando caminhos fora da academia. O projeto, pelo qual venceu o prêmio, utiliza ferramentas modernas de modificação genética para criar tilápias capazes de sintetizar hormônios humanos no próprio organismo — e eliminá-los na urina, de modo que possam ser extraídos sem sofrimento aos bichinhos. Com a falta de financiamentos para pesquisa nas universidades e o potencial inovador do projeto de biotecnologia, ela vê maior potencial em mergulhar no mundo das startups.

Para as demais pesquisadoras, que pretendem seguir na área acadêmica, o prêmio chega em boa hora. Financiamentos de agências de fomento têm atrasado pagamentos — e sem eles, fica inviável adquirir os equipamentos e os suprimentos necessários para laboratórios. Isso sem mencionar os cortes em bolsas de estudantes de pós-graduação que atuam nesses estudos. O mais complicado, no entanto, é a incerteza do futuro dos orçamentos.

“O último edital universal do CNPq, por exemplo, foi no início do ano passado. E não sabemos quando terá outro”, explica Rafaela Ferreira. Ela trabalha com doenças negligenciadas, como a de Chagas, mais especificamente no planejamento racional de fármacos, que envolve o uso de simulações computacionais para selecionar moléculas interessantes para serem usadas, futuramente, na criação de medicamentos.

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Entra aí o Para Mulheres na Ciência, que garante um financiamento de pesquisa de R$ 50 mil para cada premiada. “Mistura a exposição de um prêmio com um recurso de edital de agência que permite que os trabalhos sigam”, pontua Rafaela.

Essa visibilidade extra das cientistas ajuda, aliás, a explicar ao público que tipo de projetos de ciência de ponta estão sendo desenvolvidos no Brasil — que também é algo que adoramos fazer aqui na SUPER. “Acaba nos aproximando muito mais da sociedade”, conclui Gabriela Nestal, premiada por um projeto que estuda a resistência genética aos tratamentos quimioterápicos de câncer de mama — visa, basicamente, entender por que algumas pessoas simplesmente não respondem ao tratamento.

A sétima pesquisadora premiada no Rio de Janeiro, durante a inauguração do Centro de Pesquisa & Inovação da L’Oréal no Brasil, é Diana Sasaki, matemática da UERJ especializada em estudos de grafos. Eles são usados para resolver dilemas complicadíssimos de análise combinatória — mas que têm exemplos muito claros na vida real, como a necessidade de diferentes aviões de rotas diversas aterrissarem no mesmo local sem que tenham problemas de encontro. Essa área de conhecimento, portanto, usa simulações matemáticas para ajudar a modelar (e resolver) problemas de conflito.

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As sete laureadas desse ano se juntam às 82 brasileiras já apoiadas pelo prêmio — que tem também uma versão internacional, o For Women in Science, que premia anualmente cinco das pesquisadoras mais bem sucedidas do mundo em suas áreas (conheça as vencedoras deste ano aqui). Duas das laureadas, Ada Yonath e Elizabeth Blackburn, acabaram por ganhar, eventualmente, o Nobel.

Lucia Mendonça Previato, brasileira premiada pelo For Women in Science internacional em 2004, estava na premiação representando a Academia Brasileira de Ciências. Para ela, “comemorações como essa resultam em festa, mas principalmente em esperança”. Esperança de um futuro com mais líderes mulheres na ciência e uma realidade mais promissora para a valorização dos cientistas no Brasil.

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